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Com 46 artigos de conteúdo, a Proposta de Emenda Constitucional 06/2019, de reforma da Previdência, defendida por Bolsonaro e Paulo Guedes, traz 114 tópicos que tentam justificá-la. No último desses, uma tabela estima uma economia de R$ 1,072 trilhão de reais em dez anos, o equivalente a R$ 107,20 bilhões por cada ano, a partir da aludida reforma. A referida PEC insiste nesse mote: aprovar a reforma da Previdência para reduzir seu déficit, reduzindo-se, assim, o déficit maior do tesouro nacional, uma repetição dos argumentos que acusaram o desequilíbrio fiscal e a iminente explosão do déficit público, usados desde o segundo mandato de Dilma Rousseff (com o pacote fiscal defendido à época pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy) e também por Meirelles com Temer. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, acessados em 6 de abril último, o déficit primário, que ocorre quando a economia de gastos públicos não é suficiente para alcançar o pagamento da conta de juros da dívida pública, estava em R$ 18,274 bilhões em fevereiro de 2019. Entretanto, a necessidade líquida de financiamento do tesouro nacional para esse ano, considerada toda a dívida pública federal e dela descontadas as receitas do orçamento, estava em explosivos R$ 779,7 bilhões em apenas um ano, representando exatos 72,73% do que Guedes quer economizar em dez anos com sua perversa reforma da Previdência. Não é estranho que o ministro da Economia, com doutorado na área pela Universidade de Chicago, não enxergue isso? Vejamos: se o raciocínio dominante entre os gestores do Tesouro Nacional tem sido de que há ali um déficit público, alimentado pelo chamado “déficit da Previdência” e que esse déficit deve ser combatido para se reduzir aquele outro, maior, por que os olhos e a calculadora desses gestores só se preocupam com os números da Previdência e deixam de lado os números da parcela financeira de gastos, a maior, relacionada com o pagamento de juros e o equivalente ao vencimento dos títulos públicos? E por que, quanto a isso, nenhum dos gestores desde então apresentou qualquer proposta de reforma? Simples: porque tais despesas remuneram o capital dos segmentos mais ricos da sociedade brasileira e estrangeira (bancos, fundos de investimento, de Previdência, não-residentes), que aplicam seus ativos em títulos do tesouro nacional. A cegueira quanto a isso, porém, vira metralhadora contra gastos previdenciários e de assistência social (como o pagamento do Benefício de Prestação Continuada, o BPC, por exemplo). Paladino do ajuste fiscal, porém, Guedes não mexe nos interesses financeiros que impõem uma necessidade de financiamento para 2019 de R$ 772,7 bilhões, causa maior do desequilíbrio no tesouro nacional, mas quer uma perversa reforma da Previdência para economizar R$ 1,072 bilhão em dez anos em cima dos trabalhadores mais humildes, criando também uma nova Previdência, via capitalização, um grande negócio para os bancos. Certamente não se trata de miopia ou imperícia no exercício da função, mas de uma clara identidade de interesses com os mais ricos. Por isso a PEC 06/2019 não pode ser aprovada. As reformas urgentes e necessárias são a tributária progressiva, como temos hoje na União Europeia, a proteção da Seguridade Social contra a elevadíssima sonegação de PIS, Cofins e CSLL, as desonerações e a desvinculação de suas receitas, a reforma da política monetária e de gestão da dívida pública, que deverão tocar o coração do déficit, a causa das despesas, alterando as próprias despesas com juros e com o vencimento dos títulos. Sem isso as economias de Guedes com a PEC 06/2019 são totalmente falsas.

Publicado no Diario de Pernambuco em: 11/04/2019

Obs: O autor é professor e Mestre em Educação pela UFPE
Foi Deputado Federal 2003-2014.
Criador e 1º. Coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção (2004)
Na Câmara Federal foi autor da PEC 162, propondo o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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