O termo hospitalidade deriva do latim hospes, significa “acolhida de hóspedes, peregrinos” e tem origem religiosa: peregrinação aos santuários, centros ou lugares de acolhida dos peregrinos. Até hoje se entendeu hospitalidade como uma “obra de caridade”. Tudo isso é muito estranho para a sociedade secular, ao considerar que muitas dessas obrigações não são propriamente de caridade, mas de justiça.
Nesse contexto, não basta encarar a hospitalidade como uma obra de caridade e entendê-la como um valor. É preciso também que nos perguntemos se não seria mais adequado denominar de outra forma e que dialogasse melhor com o mundo secular da ciência e da técnica. Segundo Diego Garcia, “o valor da hospitalidade identifica-se com o valor da promoção da qualidade e da excelência no mundo da assistência e cuidado da saúde”. A hospitalidade deve tornar-se sinônima de qualidade total, ou de excelência, tanto na ordem técnico-científica quanto na perspectiva humano e ética, nas instituições de saúde. E essa linguagem tem ressonância no mundo secular hoje.
Gestão de valores − Avançando nesta direção em nossas instituições de saúde, temos que implantar uma política de gestão de valores com as seguintes características:
1) Distinguir a dimensão “transcendental” da “categorial” no tema da hospitalidade. Na perspectiva transcendente, hospitalidade expressa um tipo de vivência cristã, como nas bem- aventuranças evangélicas. Na perspectiva categorial, pode-se identificar com a promoção e busca da qualidade total e da excelência.
2) Esta dupla distinção de perspectivas é muito importante, porque se pode assumir sem problemas a segunda perspectiva sem estar de acordo com a primeira. Isto é importante frente à distinção entre instituições religiosas e seculares. Mas não podemos generalizar para o conjunto de todos os funcionários das instituições de saúde religiosas, pois isso vai contra o respeito à liberdade de consciência, uma vez que nesse nível impera o pluralismo de valores religiosos. Ainda nesse nível, deve-se exigir o estrito cumprimento do conteúdo da hospitalidade na ordem categorial, isto é, na busca da qualidade total e a excelência, caso contrário estaríamos promovendo violência.
3) Faz-se necessário definir os “valores institucionais” das instituições de saúde religiosas, evitando-se o enfoque diretamente religioso, como ocorreu até agora.
4) A toda pessoa que almeja trabalhar numa instituição de saúde religiosa, deixar bem claro quais são os valores e políticas institucionais, que se trata da busca da máxima competência e qualidade técnica e humana. Ela tem o direito do exercício da “objeção de consciência”.
5) Uma vez que o profissional assume esses objetivos, é preciso dar-lhe autonomia para que viva tais valores de forma criativa. Não se pode solicitar a excelência e logo cortar a autonomia.
6) Por fim, avaliar periodicamente o desempenho de cada profissional, segundo os objetivos e valores da instituição de saúde. Não é preciso cortar a liberdade, mas sim checar o cumprimento dos objetivos e da vivência dos valores.
A hospitalidade não é somente um valor cristão, mas também um valor humano, que nossa sociedade plural e secularizada reconhece e está tão necessitada. Sem dúvida, estamos diante de um enorme desafio para todos, mas especialmente para aquelas famílias religiosas, que fazem da dimensão samaritana do Evangelho, a acolhida e a hospitalidade, o objetivo e a razão de ser de suas vidas e instituições.
Obs: Texto postado Família Cristã 933 – Ago/2014