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Fomos surpreendidos, confesso que, pelo menos eu, de uma boa maneira, desculpem a sinceridade, com a condenação de Danilo Gentilli, esse rapaz que pensa que é humorista mas que, na verdade, é uma pessoa grosseira, sem a menor noção de respeito aos outros e que encontra eco nas mentes doentes que acham que humilhar, menosprezar, desconstruir as outras pessoas é sinal de macheza e de status. Como se ser cabra macho fosse sinônimo de ser homem.

Fazer humor é uma arte, que exige criatividade, senso crítico e, pelo menos, deveria exigir respeito e bom gosto.

Entretanto quando começo a relembrar os programas e filmes de sucesso na área do humor, o que me vem à memória são “os três patetas”, onde pancadaria e humilhação eram o ponto alto ou os Trapalhões, com suas gozações na mesma linha.

Pessoas que usam óculos, gordas ou magras demais, muito estudiosas ou o oposto, anões, louras, com problemas na fala, moradores das cidades do interior, sotaques, tamanho de nariz, pouco cabelo, sempre foram objeto de escárnio e de gozação, arrancando gargalhadas e palmas. O ser humano tem essa bizarra característica de rir das desgraças e sofrimentos dos outros. Mulheres que eram consideradas feias, eram um deleite para o humor.

A violência sempre esteve presente na história do humor. O chamado humor pastelão divertia multidões com as quedas de escadas, bicicletas, tortas atiradas na cara uns dos outros, roupas que pegavam fogo, dedos nos olhos, tapas na cara ou na cabeça.

As gerações foram passando e o humor ofensivo foi crescendo, ganhando força, até chegarmos ao humor ou melhor a falta dele, com programas de péssimo gosto como o CQC e seus herdeiros como Danilo Gentilli e o tal do Rafinha Bastos.

Se um político age de maneira pouco recomendável e vira piada, a classe se revolta, reclama, quer processar o autor das piadas. Quando um cara como esse tal de Gentilli expõe e humilha uma mulher que está fazendo um gesto nobre e digno de aplausos, como a mãe que viajava 80 quilômetros para doar o excedendo do leite que produzia e, assim, ajudava outros bebês a sobreviverem, o que seria o correto a fazer? Reclamar desse tipo de humor, dizer ao autor das infâmias que ele é um idiota, que só uma pessoa com QI muito baixo pode fazer de um gesto de amor o mote para dizer tanta coisa ruim como ele fez. A moça que morava em uma cidade do interior pernambucano foi obrigada a se mudar com sua família porque, como consequência do mau gosto desse cara, passou a ser hostilizada pelos moradores da cidade.

Ao ler uma matéria onde dizia que uma boa parte da classe humorística estava criticando a prisão do Gentilli (a prisão em si já uma piada, por ser de regime semi-aberto), fiquei pensando que, infelizmente, o corporativismo existe em todas as categorias, inclusive, entre humoristas.

Uma das alegações é a de que o que ele faz e diz sob o pretexto de “humorismo” não deveria ser punido com prisão e sim com outras punições, como multas, serviços comunitários e por aí vai.

Acho que pagar indenização para as pessoas que ele humilha e prejudica é uma excelente opção. Mas confesso que acharia melhor que, além de pagar multas e indenizações, em vez de ser preso (preso?) deveria ser suspenso e não poder aparecer em qualquer tipo de mídia por, sei lá, uns 12 meses?

Sei que com essa sentença foi ligado um alerta para todos os humoristas que fazem críticas a coisas mais sérias, coisa que estão prejudicando a população brasileira e precisam ser denunciadas. Se um queridinho da direita foi sentenciado à prisão, uma porta foi aberta para os que não são tão queridinhos assim.

Infelizmente se os Gentillis e Bastos da vida fazem sucesso com seu humor agressivo, desrespeitoso e desnecessário, significa que tem quem goste e aplauda. E sabem o que é pior? Depois de se divertirem com essa porcaria, vão pra rua e colocam em prática seus ódios, suas intolerâncias e seus preconceitos. Suas agressões são diretas, físicas e, algumas vezes, mortais.

Piada de mau goto não tem graça. Humilhar os outros não deve provocar risos. As limitações físicas de uma pessoa não podem ser objetivo de gozação.

Confesso que o que o Brasil é hoje me deixa muito confusa. Por exemplo quando vejo uma pessoa se dizer cristã, ir à missa, confessar-se, comungar e, depois que sai da igreja se mostrar homofóbica, racista, classista, machista, misógina, a favor do armamento da população, enfim, resumindo, intolerante e preconceituosa, eu me perco no caminho entre o que diz o evangelho e o que está sendo praticado por esses cristãos”.

Mas confesso que diante de tudo isso ainda não perdi a esperança de que a noite escura vai passar.

Nessa quinta-feira, 11 de abril, foram comemorados os 55 anos da chegada de Dom Helder Camara ao Recife, com um belíssimo Sarau na igreja das Fronteiras. Encerrando o evento os atores Júnior Aguiar e Daniel Barros – que participaram da peça o Profeta do Povo – relembrando o momento da chegada, fizeram uma belíssima performance. Júnior apresentando magnificamente o diálogo e Daniel representando um homem do povo, contando histórias sobre o arcebispo.

E lá pelo meio do discurso uma frase dita por Dom Helder há 55 anos me chamou a atenção, por sua atualidade e seus sinais de esperança:

“ Que depois de tanta maravilha que anda realizando, a humanidade não se divida em blocos, não se arme como nunca, não brinque com forças que amanhã poderão arrasar a terra. Que, ao invés de tanto medo e de tanto sobressalto, o homem saiba que, nos momentos mais difíceis, na escuridão mais escura, na noite mais noite, há o começo de uma luz… Que o homem,  meu irmão de grandeza e de miséria, reencontre a Esperança!” – Dom Helder Camara, 11.04.1964

E é nessa esperança que eu me agarro. A esperança de que o despertar dessa noite escura não vai demorar. E, então, quando o sol teimar em nascer, os maus humores irão se apagar, o bom humor irá retomar seu lugar e nós, travestidos de luzes e cores, iremos para as ruas, de mãos dadas – porque ninguém nunca soltará a mão de ninguém – cantar que o mal foi cortado na raiz, que apesar de quem seja, é um outro dia, o dia da Graça.

Obs: A autora é jornalista, blogueira e Assessora de Comunicação do IDHeC – Instituto Dom Helder Camara.
Imagem enviada pela autora (Tiras de Armandinho – https://www.facebook.com/tirasarmandinho/)

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