Relação significa novo laço. É a necessidade comum a todo ser humano, que nasce e cresce sempre nesta perspectiva de estar com o outro, de tender naturalmente a viver de encontros. Todo o ser é fruto de muitas histórias de encontros, desde a concepção, passando pela educação, até os dias atuais quando o crescimento existe a partir dos resultados de infinitas relações, consigo mesmo, com Deus e com o social.

Esta reflexão propõe abordar este tema, partindo do princípio de que a responsabilidade primeira para o bom aproveitamento das relações localiza-se na própria pessoa e não no outro. Não que o outro não tenha a sua responsabilidade no processo de intercâmbio, de contribuir para o sucesso deste. Entretanto, o olhar para fora de si, no intuito de ver no outro a possibilidade primeira ou única para fomentar a relação, ou até mesmo para culpar ou resolver as dificuldades que possam existir, proporciona um distanciamento natural de um olhar para dentro de si mesmo. É a lógica de que quanto mais responsabilidade há no outro, menos há na própria pessoa. E aí, pode se estabelecer uma dependência e acomodação de que a relação se desenvolva somente a partir do outro. Ao contrário de que quanto mais próxima da pessoa, maiores são as possibilidades de alcance para encaminhar o bem-estar nos encontros e as iniciativas para lidar com os desencontros. A proposta é a de mudança de referenciais, em que o ponto de partida das relações possa ser a própria pessoa, e não o outro.

Este princípio embasa a proposição de que, se cada um assume o relacionamento como um compromisso, em que a sua contribuição é a mais importante, porque depende exclusivamente de si mesmo, a iniciativa de abertura, disponibilidade e procura, está garantida para manter viva a vida das relações.

Assim sendo, o relacionamento passa a ser reflexo da própria experiência da ação de Deus, que toma a iniciativa da encarnação para dispor da relação de aliança com seus filhos, em direção à realização do Projeto de maturidade, Salvação e felicidade da humanidade. Trata-se do estar e amar para fora, garantindo a proximidade do outro, o estar com o outro. Daí a inspiração para propor uma Pedagogia da Encarnação que promova as relações humanas.

Uma Pedagogia da Encarnação ( do estar com…)

São três elementos dinâmicos, que se relacionam entre si, bem como se reforçam mutuamente para fazer valer esta proposta de favorecimento das relações: conhecimento, acolhimento e comunicação.

Conhecimento

É o exercício de olhar-se sempre mais, para sempre melhor ver o outro. Quanto mais a pessoa se conhece, mais condições terá de segurança e confiança nas próprias atitudes que favoreçam os intercâmbios. Quanto mais se conhece o outro, maior o saber para lidar e conviver. Quanto maior o conhecimento, mais ampla a possibilidade de acolhimento.

Possivelmente, a amplitude da experiência de conhecimento, tanto a si como ao outro, proporciona o encontro e confronto com o aprazível e o detestável. O que gera dor e desconforto, mas com certeza garante a convivência com autenticidade. Vale lembrar Kierkegaard : “És como uma mulher em trabalho de parto; quanto mais procuras retardar o momento de dares à luz, tanto mais continuas na dor. O que temes, afinal? Não é a um outro ser que farás nascer, mas a ti mesmo”.

Acolhimento

Significa, a princípio, aceitar o outro essencialmente como ele é, no seu estado de ser pessoa, independente das suas atitudes e limitações. Acolher a fim de trazer o outro para bem perto de si, e, na proximidade, aquecer a relação e compreender melhor a natureza das atitudes e limitações.

Aqui a ordem dos fatores pode alterar os resultados, ou seja, primeiro acolher para depois, como consequência, compreender.

Toda vivência efetiva de acolhimento pressupõe a experiência de acolher a si mesmo. Tal experiência facilita o trabalho de individuação e estruturação da própria identidade. Enfim, acolher-se como diferente e próprio, garantindo assim o acolhimento e bom convívio com as diferenças alheias. A saúde dos intercâmbios sociais depende essencialmente da forma como os indivíduos convivem com as diferenças interpessoais.

Comunicação

A palavra comunicação significa o ato ou efeito de comunicar. A capacidade de trocar ou discutir ideias, de dialogar, de conversar de influenciar-se mutuamente.

A comunicação clara sem barreiras, é muito difícil de ser mantida e, por esta razão, desenvolver relações verdadeiramente humanas é algo que exige muito trabalho das pessoas. As pessoas, em geral, têm tendência a julgar, avaliar, concordar ou discordar antes de saber o que o outro está realmente dizendo. Com isso, ouvem as mensagens pela metade, só dão atenção às que lhes interessam.

Para tanto, sugere-se clareza e objetividade para falar e para ouvir. E maior sensibilidade ainda na atitude de ouvir – e muito mais sensibilidade ainda em ouvir do que escutar. Isto porque “escutar” é a mera assimilação dos sons, ligada à capacidade física e com alcance apenas dos conteúdos verbais. Enquanto “ouvir” é a compreensão do significado, dependendo da capacidade emocional e com alcance dos conteúdos verbais e não-verbais. Agora, cada um escolhe se quer escutar ou prefere ouvir.

O convívio como lugar sagrado de aprendizagem e crescimento

Não existirá lugar mais propício para a concretização desta proposta de conhecimento, acolhimento e comunicação do que o convívio diário. É aí que tais atitudes ganham forma para desencadear laços (novos ou renovados) entre as pessoas, em função da aprendizagem para crescer. É no convívio diário que o contato com qualidade tem um significado especial. É aí que um se dispõe a crescer com o outro, num processo de mútua valorização. Daí para a identificação, desta para o sentimento de pertença…e daí para o crescimento em parceria.

Ivan Rodrigues
[email protected]
Psicólogo, Educador e representante do Colégio Antares no Programa das Escolas Associadas da UNESCO.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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