Há um cansaço na cultura contemporânea em relação a uma medicina que reduz o ser humano meramente à sua dimensão biológica orgânica. O ser humano é muito mais do que sua materialidade biológica. Poderíamos dizer que este cansaço, provocou uma crise da medicina técnico-científica e que favoreceu o nascimento de um novo modelo, do paradigma biopsicossocial e espiritual. É a partir desta virada antropológica que podemos introduzir a dimensão espiritual do ser humano como um componente importante de ser trabalhado na área de cuidados no âmbito da saúde. Já existem inúmeras publicações em nosso meio sobre essa questão que não podem deixar de passar despercebidas.

O que entender por Cuidados Paliativos? A Organização Mundial da Saúde define assim: “cuidados paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus familiares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento, da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de dor e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais” (2002).

Objetivos dos Cuidados Paliativos segundo a OMS, sao os seguintes: Proporcionar alívio da dor e outros sintomas angustiantes; Considerar o morrer como um processo normal; Não apressar ou adiar a morte; Integrar os aspectos psicológicos e espirituais de assistência ao paciente; Oferecer um sistema de apoio para ajudar os pacientes a viver tão ativamente quanto possível até a morte; Oferecer um sistema de apoio para ajudar a família a lidar com a doença do paciente e do seu próprio luto; Usar uma abordagem de equipe para atender às necessidades dos pacientes e suas famílias, incluindo aconselhamento de luto, se indicado; Melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença; aplicar no início da doença, em conjunto com outras terapias que visam prolongar a vida, como a quimioterapia ou radioterapia; realizar investigações necessárias para melhor compreender e gerir complicações clínicas angustiantes.

A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos da Unesco (UNESCO, 19/10/2005), logo na sua introdução, apresenta como fundamento uma visão antropológica integral, holística, contemplando a “dimensão espiritual” do humano: “Tendo igualmente presente que a identidade de um indivíduo inclui dimensões biológicas, psicológicas, sociais, culturais e espirituais”.

A Associação Médica Mundial (AMA), na Declaração sobre os Direitos do Paciente, revista na 171ª. seção do Conselho, Santiago, outubro de 2008, elenca onze direitos, sendo que o décimo primeiro é o “Direito à assistência religiosa”. Na íntegra: “O paciente tem o Direito de receber ou recusar conforto espiritual ou moral, incluindo a ajuda de um ministro de sua religião de escolha”.

No Canadá, o Código de Ética Médica (atualizado em 2004) ao apresentar as dez “responsabilidades fundamentais” dos médicos, no que toca ao assunto em tela diz que é uma responsabilidade fundamental do médico. “Prover cuidados apropriados ao seu paciente, mesmo quando a cura não é mais possível, incluindo o conforto físico e espiritual, bem como suporte psicossocial.”

Nos EUA, a Associação Médica Americana, numa “declaração sobre cuidados de final de vida (2005)”, diz que “na última fase da vida as pessoas buscam paz e dignidade” e sinaliza que os médicos “prestem atenção nos objetivos e valores pessoais da pessoa na fase final de vida. Os pacientes devem confiar que seus valores pessoais terão uma prioridade razoável, seja na comunicação com a família e amigos, no cuidado das necessidades espirituais, na realização de uma última viagem, na tarefa de concluir uma questão ainda inacabada na vida, ou morrer em casa, ou em outro lugar de significado pessoa.”

No México entrou em vigor em 5 de janeiro de 2009, “Decreto por el que se reforma y adiciona la Ley General de salud em Matéria de Cuidados Paliativos”. No Cap. II que trata dos “Direitos do paciente em situação terminal” entre os doze direitos arrolados, o XI diz que o paciente tem direito “a receber os serviços espirituais quando ele, sua família, representando legal ou pessoa de confiança o solicitar”.

Como vemos, hoje há um reconhecimento em termos de políticas públicas mundiais, bem como no âmbito da própria medicina, da necessidade do cuidado espiritual. A dimensão da espiritualidade é fator de bem-estar, conforto, esperança e saúde, e precisamos urgentemente que nossas instituições de saúde se organizem no atendimento desta necessidade humana. Estaria faltando um elemento muito importante no processo de humanização dos cuidados de saúde, caso negligenciarmos a promoção do bem-estar espiritual do doente (continua).

Obs: Texto retirado de www.a12.com/redacaoa12/pe-leo-pessini

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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