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1 – DOMINGO DOS PESCADORES DE GENTE
Lc 5,1-11

Olhar a vida e o mundo com um novo olhar, bem mais profundo e amplo. Descobrir, de repente, um sentido maior nas próprias tarefas do cotidiano. Transcender o que é comum e corriqueiro. É assim que Jesus, no seu Caminho, vai anunciando a Boa Nova, o Reino, o Mundo Novo, onde as pessoas, para além do que fazem simplesmente por sua sobrevivência, despertam para razões e motivações maiores, capazes de alargar corações e mentes e fazê-las agentes de transformação junto a outras pessoas, grupos e estruturas sociais.

Simão, como André, seu irmão e os amigos, filhos de Zebedeu, com certeza, à semelhança de Maria, mãe do Senhor, experimentam uma alegria maior: na insignificância da sua simplicidade, como trabalhadores sem maior importância no seio de uma sociedade dividida em classes, sentem-se convocados por Jesus para pescar gente, isto é, tirar do fundo da exclusão tantas vidas submersas, sem condição de vir à tona, num mundo de preconceitos e discriminações.

Continuemos com eles a sonhar e cantar com Maria a alegria de sermos pescados, e convocados a ser pescadores de gente.

Quinta-feira passada, 07/02, celebramos 110 anos do nascimento do Servo de Deus, DOM Helder Camara. No Solar das Fronteiras, um sarau, com direito a música, poesia e carnaval, do jeito que o DOM gostava e, com certeza, continua gostando ainda mais, lá onde se encontra, na claridade de Deus. E como esse aniversário tem um sentido maior numa conjuntura como esta que estamos atravessando! É uma alegria semelhante àquela que nos faz celebrar com fogos e fogueira o nascimento de João Batista, com luzes e lapinhas, o Natal de Jesus. Efetivamente, o nascimento do DOM, nos traz de volta, e com força renovada, a esperança da LIBERTAÇÃO… E nos faz “esperançar”, isto é, assumir, com renovada esperança e garra, o compromisso de lutar por um Mundo Novo, sem opressores e oprimidos.

 DOM Helder vive?… Viva DOM Helder!

Da morte da escuridão,

Vem a todos(as) libertar…

A nós, seu povo remido,

Para a paz faz caminhar.

<<BRUMADINHO>>, sinal dos tempos!

Acabo de receber a mensagem de um amigo lá do Centro-Oeste:
“Querido Reginaldo, paz e resistência!
Tudo bem, como você está?
Aqui vamos caminhando neste tempo tão desolador. Estive em Brumadinho, silêncio, dor, sofrimento, luto, vale de lama, vale de lágrimas… cuidados e solidariedade.
Vale da morte, insana, louca, assassina.”

A última frase foi de morte e de crime. Eu teria desejado que o recado tivesse terminado com as palavras finais da frase anterior, “cuidados e solidariedade”
Realmente, Brumadinho repete, hoje, a visão do Profeta Ezequiel (cap. 37), que a gente costuma cantar na Quaresma:
“Imensa planície
juncada de ossos,
coberta de mortos
sem vida e calor!”
Mas, nos gestos mesmos de solidariedade e cuidado, na indignação, nos protestos e na mobilização de todos e todas que têm fome e sede da justiça, há uma esperança de RESSURREIÇÃO!
Amigos, Amigas, Companheiros, Companheiras, é tempo de “esperançar”, como nos ensinou o grande pedagogo do século XX, Paulo Freire. Vamos acreditar no potencial de solidariedade e de luta que está sedimentado no coração de nossa gente.
A Quaresma se aproxima e o Carnaval nos anima: nosso destino é a alegria, a festa.
Vamos aproveitar o ensejo da próxima Campanha da Fraternidade. Vamos acordar a consciência solidária e a militância de nossa gente. Vamos investir nos Círculos Bíblicos, no Grupos de Evangelização: um processo de conscientização incrementado pela fé n’Aquele que deu a vida para que tenhamos Vida, e Vida em abundância!
De toda situação de morte, fruto do descaso dos governantes e da acomodação dos governados, através da luta consciente e organizada por políticas públicas, vamos construir respostas adequadas para nossas necessidades básicas de moradia e saneamento básico, de saúde, educação e cultura, de emprego, transporte e segurança.

“A Páscoa haverá, e o povo a cantar ALELUIA!”

 2 – Domingo das “BEM- AVENTURANÇAS” e dos “AIS!”
Lc 6,17.20-26

O anúncio do Reino de Deus, a essência da mensagem cristã, começa pela primeira das Bem-Aventuranças, aquela que proclama, paradoxalmente, a felicidade dos pobres e da pobreza… Há quem diga que começa por aí a reconquista do “paraíso perdido”. Na ótica de Lucas, que parece ser a mais próxima do pensamento original de Jesus de Nazaré, sem solidariedade efetiva com os empobrecidos da terra, não há esperança de salvação, de mudança das pessoas e da sociedade. Ao mesmo tempo, sem a postura, preconizada por Mateus, de uma “pobreza em espírito”, vale dizer de uma atitude profunda de despojamento, de desprendimento e entrega nas mãos do Pai, a serviço da Humanidade, o Reino dos Céus não acontecerá aqui “na terra”, como Jesus nos ensinou a pedir. “Ai” de quem não entendeu a proposta do único Mestre que se precisa escutar. “Ficar na sua”, fechar-se a um olhar mais amplo, deixar-se cativar pelos engodos imediatistas do consumismo capitalista, é optar pelo pior dos mundos, onde alguns se empanturram de coisas e se encurralam no medo de perdê-las e a grande maioria apodrece na miséria, quando não se rebela e faz “o feitiço virar por cima do feiticeiro”. Sem falar no troco, que a Natureza devastada, nos vai aprontando. Mas somente quem se liberta deste círculo vicioso terá inspiração e fôlego para cantar o canto da “Felicidade” verdadeira, nos ensaios da Terra Prometida, nossa celebração, cada domingo.

2019 começa como um “ano de desgraça”:

 – Não bastasse a consumação do “golpe” iniciado em 2016, com a ascensão do fascismo obscurantista ao  poder…
– a tragédia criminosa de Brumadinho..

– o incêndio criminoso nas dependências do Flamengo…

– a chacina que vitimou 13 jovens por mãos policiais, em favelas do rio de Janeiro…

Eis o pecado do mundo! Eis a sociedade que rejeita a proposta das Bem-Aventuranças! Eis os “crimes hediondos” do Sistema Capitalista Neoliberal!
Seremos capazes de reverter este quadro?
A Campanha da Fraternidade poderá ser um passo importante na direção de um mundo diferente, que não precise ouvir os severos “Ais” de Jesus. Coragem!

————————————–

Coisa que os poderosos não gostam de ouvir:

A catástrofe de Brumadinho

  A cada dia que passa os meios de comu-nicação nos assustam com nova contagem de corpos achados na lama e anunciam o número de desaparecidos. Estamos sempre mais horrorizados com uma catástrofe que ceifou a vida de tantas pessoas.  (… …)

     Não hesitamos, porém, de denunciar a negligência e omissão dos responsáveis por esse crime e insistir que sejam apuradas as verdadeiras causas do rompimento da barra-gem. Os desastres de Mariana, Barcarena e de outros lugares ficaram até hoje sem expli-cação convincente e manifestam a face cruel e desumana da mineração no Brasil.

     Na Prelazia do Xingu, depois de Belo Monte com seus efeitos tão negativos para os ribeirinhos e indígenas, chega uma empresa canadense que pretende explorar as minas de ouro na Volta Grande do Xingu. Se o projeto chegar a concretizar-se ameaçará de modo dramático os sítios arqueológicos e afetará sensivelmente o ecossistema da região.

     Estamos muito apreensivos e temerosos diante dos enormes riscos que esse empre-endimento significa para o ser humano e o meio ambiente. Quem realmente pode ga-rantir que as instalações previstas tenham a segurança apregoada? Sabemos, no entan-to, que as consequências de um desastre serão irreversíveis e jamais haverá recupera-ção das águas e das áreas atingidas no Xingu.

     Apelamos aos Governos Federal e Estadual para que se abstenham de conce-der licenciamento a uma empresa estran-geira que quer levar o ouro do Brasil, deixan-do atrás de si uma paisagem lunática enve-nenada.

 Altamira, 10 de fevereiro de 2019
Dom João Muniz Alves, ofm
Bispo do Xingu
Dom Erwin Kräutler, cpps
Bispo emérito do Xingu

Obs: Reginaldo Veloso de Araújo é Presbítero das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, no Morro da Conceição e Adjacências, Recife-PE. 
Compositor litúrgico, com diversos CDs gravados pela COMEP/Paulinas e pela PAULUS
Assistente adjunto do Movimento de Trabalhadores Cristãos – MTC-NE2
Assessor pedagógico do Movimento de Adolescente e crianças – MAC e do PROAC
Membro da Equipe de Reflexão sobre Música Litúrgica do Setor de Liturgia da CNBB
Mestrado em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana – PUG (Roma, 1962)
Mestrado em História da Igreja, pela PUG (Roma, 1965)

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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