Ina Melo 1 de novembro de 2018

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” A vida me ensinou que não devo mostrar o mar que  tenho dentro de mim a quem não sabe nadar”
Foi assim que Ana Maria começou a longa carta endereçada ao grande amor de sua vida. Sim! Ela pensou que Rui era o seu porto seguro.  A estrela que a guiaria pela vida inteira. Aquele  que acompanharia até o final dos tempos os seus sonhos e desencantos!
Depois de seguirem por caminhos tortuosos e quase impossíveis pela longa estrada da vida, ela descobriu que era apenas um fogo-fatuo de ilusão na sua existência. Em plena juventude, renunciou a ter vida própria. A sua luz era um reflexo das migalhas que sobravam do  brilhante firmamento dele. Cega de amor, deixou de ser árvore frondosa para ser a sombra que ampara o caminhante. Por muito tempo se deixou levar num mar de águas mortas, escondendo assim todas as grandes ondas que morriam na praia nos dias de tempestades. Ele era o rei e senhor de todas as verdades! Sob o manto da mentira, escondia o desejo em nome da paixão! Omissa, ela se afogava nas migalhas que sobravam dos seus banquetes pantagruelicos. Vivia na eterna ilusão do amor. Até que um dia, no pleno florescimento da maturidade, acordou viu  à  sua frente o imenso oceano e pensou : que fiz da minha vida? O que me oferece o amanhã? Ao chegar na repartição aonde se arrastava por quase três décadas, fez um longa carta de despedida e deixou em cima da mesa de Rui. Em vez de ir pra casa, passou num grande magazine,  comprou roupas alegres e caras e foi ao melhor salão de beleza do bairro. Raramente aparecia por lá. Acreditava sempre nas conversas ao pé de ouvido quando ele ia visita-la e dizia.  “Você só precisa ser bonita para mim.” Ao entrar com as sacolas cheias, foi dizendo. Hoje o dia é todo meu. Entregou-se nas mãos dos profissionais de beleza e disse: quero sair daqui outra mulher. A senhora grisalha que entrou tinha desaparecido nas asas do tempo, deixando surgir uma nova mulher. Olhou-se no espelho e não se reconheceu. Estava vestida de primavera. O tecido leve estampado de flores do campo ressaltava seu corpo ainda firme. A pele branca e bem cuidada (ela só cuidava do corpo, pois sabia que era o deleite do seu amor) estava à amostra no generoso decote que lhe deixava o colo nu. As pernas bem torneadas, sempre cobertas pelas saias e calças compridas, se sobressaiam aparecendo livres numa sandália alta e transparente. Unhas e lábios  pintados de vermelho faziam dela outra pessoa. Deixou as sacolas em casa, ignorou os recados da secretaria eletrônica e saiu. No carro,  ligou o rádio e começou a cantarolar acompanhando o jovem cantor. Pegou a estrada do litoral de onde podia ver o mar aos seus pés e pensou. “Por que  deixei que esse grande mar que existe em mim, ficasse nas mãos de alguém que nunca aprendeu a nadar?”. No quase anoitecer parou num belo Hotel, reservou o melhor apartamento por tempo indeterminado e foi apreciar o nascer da lua.  Deixara para trás a mulher passiva e tola. Agora iria assumir aquela que povoava os seus sonhos de liberdade, que sabia existir no mundo de hoje, do qual sempre se recusou a participar. Enquanto saboreava uma taça de champanhe, fez um brinde solitário à lua e ao futuro. A metamorfose se deu mais rápida do que ela esperava. Recolheu -se quase à meia-noite, ligeiramente embriagada, com o corpo revigorado e prometeu que dali pra frente seria outra mulher.  Set/018

Obs: Imagem enviada pela autora.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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