Ivan Rodrigues 26 de setembro de 2018

Missa de 7º dia do Nosso Antônio, nosso Professor Antônio!

O convite para refletir sobre as leituras da liturgia desta celebração se converte numa partilha de sentimentos, sem nenhuma pretensão de ensinar ou converter, mas de celebrar a vida do Professor Antônio através da doação destas minhas palavras que desejam unir os nossos corações em torno da lembrança da sua vida conosco.

O que fazemos hoje aqui e todos os dias na Eucaristia, é tornar real o mistério da Ressurreição, é tornar factível o ”todas as vezes que se reunirem em meu nome eu estarei com vocês…”. No mistério pascal da Ressurreição de Jesus, deveríamos já ter encarnado a certeza de que a vida não é interrompida com a morte. O evangelho de Marcos hoje é explícito, onde Jesus faz esta que é a 2ª predição da sua morte e ressurreição, e desde ai Ele vem tentando nos preparar para a única realidade da qual temos certeza, e da qual nunca estamos preparados; talvez porque não compreendemos e internalizamos a verdade da Ressurreição. Nos prepararmos para tudo que é passageiro, líquido… nos preparamos para tudo, como o futuro profissional, preparação para os concursos, para os relacionamentos, para o casamento, preparação para ter filhos, para ter sucesso… tudo absolutamente incerto! Nos preparamos para as incertezas, e não conseguimos nos preparar para o que já está tão bem definido e certo – a morte e a ressurreição!

O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão. Mas, três dias após sua morte, ele ressuscitará. Os discípulos, porém, não compreendiam essas palavras e tinham medo de perguntar”. Já faz muito tempo que Jesus vem com esta aula de preparação!

Os discípulos não compreendiam essas palavras…e nós as compreendemos?

Mais do que compreendê-las hoje, precisamos senti-las como realidade interna e pessoal – cremos num Deus que transcendeu a cruz, fazendo da Ressurreição uma realidade que vai além do fim palpável, e que faz da morte parte integrante da vida e que sem ela a própria existência não seria completa.

E assim, Jesus permanece na história da humanidade, em nossas histórias, pela sua experiência pessoal, pelas suas palavras, suas atitudes, posições políticas de preferência pelos mais discriminados, pelas suas amizades, pelas suas experiências de amor… pela sua vida, Jesus permanece conosco…Ressuscitado, e muito bem Ressuscitado! Assim contemplo sua Ressurreição em mim.

Assim contemplo meus sentimentos na vida completa do nosso Professor! No tanto que falamos dele, na recordação das histórias que vivemos com ele, na referência de homem justo e sábio, que como “filho de Deus”, Deus o defendeu e o defenderá, como bem diz a 1ª leitura do Livro da Sabedoria, exemplo de serenidade e paciência (permanecendo na mesma 1ª leitura)… e especialmente no amor que sentimos por ele, realizamos o milagre da eternidade, da ressurreição em nossas existências. Ele e todos a quem amamos não morre nunca, pelo amor e pelo tanto do amado que se encarnou em nossas existências. Assim contemplo sua Ressurreição em nós.

Assim contemplo, bem humanamente, a experiência da ressurreição…que só poderia vivenciar com a experiência da morte – e por isto, a morte não pode ficar de fora da vida que quer ser completa.

“Viver sem morrer é viver menos. É impedir o pleno ser. É partir sem nunca chegar, É jamais poder ressuscitar. É aceitar viver em vão. Por isso, cedo quiseste voar, buscando a libertação.” Leonardo Boff.

Toda liturgia da celebração de hoje é a liturgia deste 25º domingo do tempo comum, isto para dizer que não escolhemos esta liturgia com estas leituras, e sim, fomos escolhidos e conduzidos para esta liturgia tão bem acertada para celebrarmos a vida e ressurreição do nosso Professor. Já percebemos em algumas reflexões acima.

Na minha humilde e pobre teologia, estas duas leituras preparam muito bem para a mensagem central do Evangelho, além de nos inserir acertadamente nesta celebração da páscoa do nosso Professor.

Na primeira do Livro da Sabedoria, o justo é posto à prova pelos ímpios duvidando do socorro de Deus. Aqui Deus como Princípio e Fundamento da certeza de que Ele está conosco, nos ama e nos aceita como somos (Princípio e Fundamento, inspiração e patrimônio dos Exercícios Espirituais de St Inácio de Loyola).

A carta de São Tiago para várias comunidades aponta para desordens, contendas, guerras…e tudo para atender seus próprios prazeres, comprometendo a justiça que é garantia da verdadeira paz – como diz o próprio Tiago: “O fruto da justiça é semeado na paz…”, não existe paz sem justiça.

Duas grandes tentações nestas duas mensagens e que experimentamos comumente. A primeira, no Livro da Sabedoria, é a de onde está Deus nos tempos de dores e escuridão? Flecha que é aplacada pela assertiva de Jesus quando segurando uma criança (no tempo de Jesus a criança era de pouquíssimo valor aos olhos da sociedade, só importava para os pais e familiares) e diz: “Quem acolher em meu nome uma destas crianças é a mim que está acolhendo. E quem me acolher está acolhendo não a mim, mas aquele que me enviou”. Pronto, ai está Deus…acolher Jesus como centro de tudo é manter Deus vivo sempre, inclusive nos tempos de dor. E quando não conseguir encontrar Jesus perto de si, saia de si e vá ao encontro dos que mais sofrem, que no sofrimento do outro, Ele se revelará.

A segunda tentação, na carta de Tiago, de que a justiça é para atender a uma paz pessoal e que tudo a ser pedido é para o bem próprio, como a disputa entre os discípulos de quem era o maior, vai por água abaixo com o “quem quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!”.

Nestas duas afirmativas de Jesus visualizo, de forma concisa, as Bem- Aventuranças, que é seu plano de metas para construção do Reino de Deus : nossa vocação à vida é para o serviço, para o bem ao outro, para o próximo que mais precisa!

Aqui as palavras de Jesus me conduzem a vida de serviço que foi a do Professor. Serviço como filho e irmão… senti bem de perto a paixão de D. Maria, sua mãe, por este filho e a devoção, também apaixonada da irmã Dorinha (Toinho pra cá, Toinho pra lá…e esse filho e irmão que sempre viveu no coração destas duas mulheres, permanece para sempre).

Serviço a sua Igreja, desde a sua trajetória como seminarista nesta Arquidiocese, até sua vocação laical na família, no nosso Grupo de Jovens Girassol (padrinho eterno do nosso grupo junto com D. Marísia sua companheira), no seu engajamento na Paróquia de Cajueiro. Serviço a sua Igreja Católica sustentado pela sua experiência de fé.

Serviço e entrega tão radical à sua profissão, que encarnou para sempre em seu primeiro nome, o nome da própria profissão : professor!

Serviço convertido em vocação à construção de sua família, gerada pelos 56 anos com sua Marisia, sua escolhida, sua guerreira para todas as lutas, de todas as dores, de muito mais sorrisos, de muitos Sãos Josés ( o da Coroa grande mesmo), na vida e agora na ressurreição – amor que não tem como não ficar para sempre! Eis neste amor, uma boa prova para quem não acredita em eternidade.

Serviço em parceria com o Deus Criador para suas mais caras obras : Lourdes, Cláudia e Alexandre. Neles o Professor permanece, não só pelo amor, mas pela carne, pelo sangue, pelos valores, pelo exemplo de sabedoria, pela entrega de vida…por tudo! Com esta paternidade, muitos de nós estagiamos para sermos os pais que idealizamos ser. Pela sua paternidade, seus netos, inclusive os adotados, experimentaram o amor dobrado do pai, disfarçado de avô.

Serviço a todos nós que o conhecemos e fomos agraciados com o seu convívio e sua amizade. Todos nós seus irmãos, suas cunhadas, sobrinhos, familiares, genros, nora…. Todos nós seus filhos do Girassol, onde sua casa foi seu coração e seu coração nossa eterna casa. Todos nós seus amigos aqui presentes, ausentes, distantes… Serviço a todos nós para sempre.

Serviço que permanece em todos nós, tanta gente para manter viva a sua vida – esta é a sua ressurreição.

Tanta gente que tem tantas histórias com você Professor e que gostariam de estar aqui agora compartilhando conosco alguma delas. Assim quero concluir esta partilha com uma dessas tantas histórias. Esta foi comigo Professor e você vai lembrar. 1985, eu, com 20 anos, há 33 anos atrás, preste a entrar no Noviciado dos Jesuítas, tinha que fazer uma carta solicitando o ingresso. Depois de feita levei para você corrigir e conversamos sobre minha vontade de ser padre, sua experiência no seminário e a razão da sua saída por causa da incompletude na opção, ou seja, não era feliz na vocação e que tinha certeza de que Deus o queria realizado. Segui a minha estrada na Companhia de Jesus, descobrindo mais tarde que não era esta minha vocação. Uma carta para entrar, agora outra carta para sair, explicando as razões da nova opção. E agora, cadê você para me ajudar na correção? Estava distante, mas você estava no meu discernimento quando lembrei da nossa conversa sobre a certeza de que Deus nos quer felizes. Já experimentava ali, mesmo separados pelo tempo e a distância, a sua presença… você já ressuscitado em mim!

Obrigado Antônio, obrigado Professor Antônio pela sua vida em nossas vidas, por todo seu amor, pela sua missão completada em nossas histórias, por deixar-se conduzir pelas mãos de Deus para nos fazer felizes.

Permanece conosco Professor, cuidando da gente, para sempre com a gente, agora bem mais perto do Pai. Fica conosco.

Ivan Rodrigues, seu Mano e seu Filho de sempre e para sempre, na vida, na morte e na Ressurreição.
Recife, 23 de setembro de 2018.

Ivan Rodrigues
[email protected]
Psicólogo, Educador e representante do Colégio Antares no Programa das Escolas Associadas da UNESCO.

Imagem (Foto) enviada pelo autor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


busca
autores

Autores

biblioteca

Biblioteca

Entrelaços do Coração é uma revista online e sem fins lucrativos compartilhada por diversos autores. Neste espaço, você encontra várias vertentes da literatura: atualidades, crônicas, reportagens, contos, poesias, fotografias, entre outros. Não há linha específica a ser seguida, pois acreditamos que a unidade do SER é buscada na multiplicidade de ideias, sonhos, projetos. Cada autor assume inteira responsabilidade sobre o conteúdo, não representando necessariamente a linha editorial dos demais.
Poemas Silenciosos

Flickr do (Entre)laços
[slickr-flickr type=slideshow]