Agora não é mais dúvida. É certeza. Os parabéns, que a gente recebe quando muda de idade, simbolizam, no fundo, o regozijo de todos por estarmos vivos, ou seja, por aumentar a idade sem que a morte ainda não nos tenha vindo buscar. Ninguém se iluda com outra verdade, porque esta é uma só. A mudança de idade, que o aniversário natalício retrata, é a vitoria do homem sobre a morte, vitória provisória, aliás, porque a morte está ao redor, circulando, ameaçando, dando avisos, e, o homem, que não pode caminhar para trás, porque o tempo não conhece a marcha-ré, permanece andando, diariamente, em direção ao dia seguinte, isto é, em direção ao futuro, mesmo sabendo que lá, adiante, escondida, bem escondida, está a morte, que, mais cedo, ou mais tarde, há de transformar o homem num cadáver.

A idade é um ingrediente que o ser humano assinala e destaca para que todos saibam que, na frente, a morte nos espreita e nos vigia, atenta a cada passo que damos. Daí o costume que todos temos de, nas inscrições colocadas nas sepulturas, inserir o nome do morto, data de nascimento e da morte, como forma de mostrar que esse viveu muito, aquele outro, pouco, e assim por diante. Neste sentido, os que frequentam o cemitério ouvem, com constância, a porta de cada túmulo o espanto que a idade do defunto causa, seja por ter vivido muito, seja por ter vivido pouco, seja por ter falecido em qualquer idade. O comentário é usual, o espanto é comum, qualquer que seja a idade do morto que a pedra da sepultura revela.

O retrato, a frente do túmulo, a partir do momento em que a invenção da fotografia assim permitiu, é outra forma do homem de mostrar o contraste entre a vida, que a foto revela, e a morte, que o túmulo esconde, a transformar bonitos e feios, brancos e pretos, ricos e pobres, honestos e ladrões, jovens e velhos, incluídos ou não nas delações premiadas, etc. e etc., em um monte de ossos, que o tempo vai diluindo, no que, aliás, invoca secular lição, talvez trazida em um dos livros da Bíblia, a ressaltar que o homem veio do pó e ao pó retornará, realidade que, no dia a dia, o homem esquece, se achando eterno, sem levar em conta que a morte estará a frente de todos, mais dia, menos dia, além do que o mundo está dando voltas, e,será numa dessas que a morte aparecerá para engolir o homem.

Pois bem. Quando comecei a escrever essas mal traçadas linhas, o objetivo era mostrar apenas o significado real do aniversário natalício e o motivo dos parabéns dados ao aniversariante. Acabei enveredando por outros caminhos. Acho que o bom anjo, que me inspira, está taciturno na manhã de hoje, terminando por me contagiar. De minha parte, espero não ter levado ao leitor um assunto desagradável. Se levei, desculpas. O interesse era outro. ( 21 de abril de 2017)

Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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