Devia existir uma lei que proibisse a presença de uma noiva feia. Toda noiva deveria ser bonita e meiga. Não deveria existir noiva feia, até porque a palavra noiva é, por si só, a mais bonita da trilogia que se inicia com namorada e se encerra com esposa. Noiva feia deveria ser impedida de casar em frente do altar, a cerimônia se realizando na sacristia, sem direitos a sermão de espécie e tamanho algum, muito menos a fotos, não podendo o ato, da chegada dos noivos até o casamento, durar mais de trinta segundos, a fim de que o rosto da noiva não ficasse marcado pela curiosidade dos convidados e penetras. Rua, rua, coisinha feita, para não assustar os santos e as santas na imaculada pureza de seu altar.

O sermão, por seu turno, seria reservado, única e exclusivamente, a noiva bonita, dessas que deixa o convidado, seja padrinho ou não, com água na boca, conscientes todos de que, numa interpretação literal, desejar a noiva dos outros não é pecado, porque esse só se limita a mulher do próximo, e, por mulher do próximo, deve ser entendida a esposa, ou seja, a noiva que, após a cerimônia, sai do altar na condição de casada. Aí, sim, se torna a mulher do próximo, que não deve inspirar o desejo de ninguém, para que o pecado não se concretize. A noiva ainda não é a mulher. É apenas noiva, e, como noiva, naquele exato e fugaz momento, deveria ser exuberantemente bela.

Sobre a debutante, também a mesma exigência. Debutante feia é uma praga. Não é debutante. É assombração, com força suficiente para causar dor de barriga no convidado antes de deglutir qualquer salgadinho. Debutante feia deveria dançar marcha fúnebre, se alguém poder descobrir qual o passo que se deve dar, e, ademais, deveria fazê-lo com o avô morto, para que os presentes ficassem sem saber escolher o que era mais feio: a aniversariante ou o defunto. Urge uma lei que proíba festa de debutante quando a aniversariante é feia, de modo que nem um decorador consiga o milagre de fazê-la bonita.

Verdade que faltou nos dez mandamentos um deles proibindo a mulher feia de entrar na igreja como noiva, como a proibição da debutante feia de fazer sua festa. A legislação poderia suprir a omissão da religião, mas, talvez, nenhum parlamentar queira entrar em choque com a grande legião das feias, que também são eleitoras. A essa altura, acredito, quem for feia e quiser jogar pedras no combate a essas modestas e despretensiosas divagações nada filosóficas, a direcione a Vinicius de Morais, autor da terrível frase: As feias que me desculpem, mas a beleza é fundamental. E aí justifico eu: só estou citando. (15 de julho de 2017)

Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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