Encontrei uma amiga e mestra, numa atividade de Educação Popular, com vários movimentos. Ela chamou minha atenção porque se apresentou dizendo que seu nome era paroxítono, com K e sem acento. No final, trocamos correio eletrônico e, mais tarde, me convenceu que usar o Whatsapp era vantagem. De passagem, nos vimos, de novo, noutra atividade de formação. Na continuação da amizade, vi que ela merece sim, um grande assento.

1. Sem alarde na campanha, a amiga ganhou a eleição e se fez diretora da sua escola pela referência que já tinha, pela dedicação que demonstra e, mais ainda, pela ousadia de tentar uma gestão democrática. No abstrato, é fácil apoiar uma administração que envolva todos os atores como protagonistas. No concreto, foi difícil encarar o acomodamento, o medo de mudar, a mente escravizada que aprendeu a ter chefe, a obedecer, a delegar seu poder.

2. Quando tentou sistematizar sua experiência para dissertação de mestrado ela falou que tinha errado noventa e nove vezes, mas que, por fim, acertara. Viu depois que o que chamava de erro eram ensaios que prepararam o acerto. Erro é não fazer o que se aprende; maior analfabeto é quem aprende a ler e não lê. As incontáveis tentativas da criança de falar, pegar a colher…e as cansativas repetições dos instrumentistas são ensaios de um concerto.

3. Um dia, ela mandou uma mensagem que dizia: “meu” amigo, desculpa-me pelo possessivo. Depois vimos que o cuidado com as apropriações indevidas, a dominação… podem nos levar a condenar qualquer forma de posse. Na amizade, a posse não é apropriação. Entre pessoas amigas há uma entrega mútua, onde cada pessoa “ocupa” parte uma da outra. O poeta diria: quando entes queridos se ausentam, deixam de estar conosco para estar em nós.

4. Uma vez, ela mandou um áudio; dizia que a fala é mais natural e a entonação ajuda “a matar a saudade”. Mas, logo emendou – “saudade não se mata; quanto mais se tenta matar a saudade, mais ela desabrocha”. Recordar, sentir falta da presença, reviver experiências e cenários e, ainda mais se for à distância, “só servem para acumular beijos e abraços” que logo abarrotam o armazém… e que o melhor dos encontros não consegue esvaziar.

5. “Não vou perder minhas crianças para o tráfico, pra fome, pra rua” decidiu a amiga e mestra, diante do desespero das mães e os míseros recursos para adotar a Educação Integral na Escola. Muitos diretores, com razão, hesitam em implantar. Chamou a escola para o bom combate, olhou a pequenez da sustentação e ousou. Ousadia não é romance, irresponsabilidade ou aventura; ousadia é o risco de crer e apostar na Esperança. Ela, sem tirar os pés do chão, faz das tripas coração e segue, como se visse o impossível. 07/06/2018

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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