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A cada ano, no Brasil, o comércio e a sociedade festejam o “dia dos namorados”. Mesmo em tempos de crise, os meios de comunicação divulgam promoções especiais e os casais se trocam presentes. No entanto, uma sociedade que reduz as pessoas a peças de produção e de consumo não pode compreender a linguagem do amor. Ela leva as pessoas a sobreviverem na competitividade e na luta meramente egoística.

Por outro lado, quanto mais uma realidade como a vida centrada na amorosidade é preciosa e rara, mais são frágeis as palavras para expressá-la. Hoje em dia, o próprio termo “amor” parece reduzido a emoções rápidas e a experiências passageiras. Poucos creem no amor como princípio e luz de toda a vida. E quando o amor é confundido com o uso da outra pessoa, a vida se torna medíocre e sem horizontes. Uns buscam acima de tudo o dinheiro. Outros lutam ansiosamente pelo poder, ou se fecham no culto de si mesmos. Camus dizia: “Não ser amado é uma falta de sorte, mas não amar chega a ser uma tragédia imensa”. Martin Buber, grande espiritual judeu, dizia: “Os sentimentos moram no ser humano, mas é a pessoa que mora no seu amor”. Quando se descobre e se vive isso, aí sim o amor é casa e estrada de vida, enraizamento e transcendência. É a única energia que conduz a vida à sua plenitude. O psicólogo Eric From dizia que amar não é algo instintivo e natural como muita gente pensa. Amar é uma arte e se aprende.

Há pessoas que se apaixonam de um modo egocêntrico e possessivo que as fecham a todos os demais. O amor romântico parece fadado a ser exclusivo e exclusivista. Ao amar alguém, se ignora e, de certo modo, se rechaça todos os demais. A espiritualidade nos ensina outro modo de amar. Como no Chile revolucionário do começo dos anos 70, cantava Violeta Parra mais ou menos assim: “Graças à Vida que tanto me deu. Deu-me teus olhos que me iluminam, e me fazem descobrir a luz, nos olhos de todos. Como te amo, acolho a tua voz e ouço teus passos. Isso me faz descobrir alegria na voz de toda pessoa humana e sentir que os passos de todos me aproximam de ti”.

De fato, só se nos mantemos apaixonados/as pela vida, pelas pessoas e pela beleza da natureza, seremos capazes de testemunhar uns aos outros a bênção original do amor divino que fecunda o universo.

Conforme a Bíblia, toda pessoa que ama vive uma experiência divina porque Deus é fonte de todo e qualquer amor humano. Mesmo no meio das imperfeições e buscas afetivas, o Amor divino conduz a pessoa a formas de amar mais profundas e generosas. Desde o começo da Bíblia, Deus prometeuestabelecer uma presença no mundo e guiar as pessoas que se abrissem à sua inspiração. Revelou-se presente na criação fazendo de cada criatura viva um sinal do seu amor e de sua bênção para o universo. Manifestou-se como fonte de bênção no canto dos pássaros, no vento que faz sussurrar as palmeiras, no riso das crianças, mas principalmente em cada pessoa humana, aberta ao Espírito. Em tempos mais antigos, deu vários sinais de que queria fazer uma aliança de amor com a humanidade e com todos os seres vivos do universo. Revelou-se plenamente presente na pessoa de Jesus de Nazaré, testemunha da ternura divina para com toda a humanidade. De acordo com a fé cristã, a partir da ressurreição de Jesus, o Espírito Divino foi dado a todas as criaturas. Quem aceita acolher, na intimidade do seu ser mais íntimo, o Espírito Divino, se torna testemunha de que o Amor vale a pena e é o único caminho que nos faz feliz. E o amor é um só, mesmo se toma expressões diversas, como amor de mãe, amor de irmãos, amor de amigos e amor de namorados.

Atualmente, a espiritualidade mais profunda nos propõe que deixemos nossa afetividade aflorar (geralmente, as pessoas a reprimem achando que isso é sinal de maturidade humana). De fato, para que sejamos testemunhas fieis do Espírito que é Amor e se manifesta em nós, é bom que aprendamos a nos apaixonar sempre e cada vez de novo.

Obs: O autor é monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares.
É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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