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É quase por acaso (se é que ele existe) que a coluna me chega às mãos. “Chapa Quente” é seu título e, por agora, não me importa lembrar o nome do autor. Seu conteúdo é que me provoca. É através do jornal “O Dia”, que mergulho mais uma vez na questão das drogas.

Importante dizer que esse não é um assunto pelo qual passo teoricamente, até porque, como já perceberam os que me lêem, não tenho o perfil de quem fica recitando teorias e conceitos que não tenham brotado de minha experiência. Nesse caso, a vivência pessoal é da dor de muitas perdas, que talvez pudessem ter sido evitadas e da escuta de muitas angústias de jovens, que diariamente me confiam, no consultório, seus desejos e suas dúvidas.

Então, voltando a minha leitura do colunista, penso que ele, pretensamente querendo ser realista, passa a sensação de ser, também, um adolescente mal resolvido.

A fórmula que recomenda, ao fim do texto, para os pais usarem na orientação dos filhos é dizer-lhes que droga é uma coisa prazerosa, que freqüentemente vicia e às vezes mata. Não estou fazendo uma citação literal, mas a essência e construção é esta, com certeza.

O certo é que isso me entra pelos ouvidos quase como propaganda. O uso dos adjetivos e advérbios nas frases e a ordem em que são colocados os predicados, com certeza acabam ressaltando a primeira afirmação,  fortalecendo o interesse pela droga, enaltecida pelo autor como grande fonte de prazer, num mundo em que o prazer virou, ele mesmo, uma droga aliciante. E é,  como todas as outras, propagandeada como tão mais valiosa quanto mais difícil de encontrar.

Folheio o jornal (de trás pra frente, como é meu costume), buscando me inteirar do fato que motivou esse tema. Aí está: a morte de um rapaz de 17 anos numa festa rave.

    Que sociedade louca somos que autorizamos festas que duram 24 horas, em locais sempre distantes de centros urbanos, com aparatos de primeiros socorros já previamente tratados e organização interna que oferece duchas e locais de descanso e recuperação, durante o evento, como maratonas ritualísticas de suicídio e que, assim mesmo, fingimos espanto ou dúvida de que haja consumo de drogas entre os freqüentadores?

    (É preciso lembrar que grande parte das festas de formatura de grandes escolas cariocas já usam o pronto-socorro de plantão como parte da produção.)

    Por que os traficantes perderiam um ponto de vendas tão garantido como esse?

    Por que somos tão cínicos a ponto de querermos responsabilizar seguranças e policiais, que todos sabemos participantes do mesmo mundo de simulacros em que estamos envolvidos, pela vida de nossos jovens?

    Claro que não autorizar esse tipo de evento não impede que os jovens se destruam, consumindo drogas, intencional ou apenas incautamente. Mas não é preciso facilitar a reunião de milhares de cordeiros e a presença de inúmeros lobos famintos ou melhor dizendo, a reunião de inúmeros lobos jovens à mercê de lobisomens.

    Porque é disso que se trata e aí, inicialmente, o colunista tem razão: um dia todos fomos jovens (lobos). Apenas, é preciso pensar nos que se tornaram lobisomens e não podem mais voltar à condição anterior, de lobos saudáveis. Estes não sabem mais uivar para a lua, sem sair em busca de sangue. No máximo ficam por aí, ganando, feridas semi-abertas, a cada vez que entrevêem seu brilho magnético e sentem o cheiro da carnificina no ar…

    Vou continuar…  Me aguardem!

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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