Djanira Silva 15 de fevereiro de 2018

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Sempre admirei a simplicidade de certas pessoas que se assemelham, em algumas coisas aos animais – seres que gostaria de poder imitar.

Tive uma empregada que veio do interior. Além da ignorância por não ter estudado, ou pelo menos, convivido com pessoas cultas, tinha aquela inocência própria dos seres criados sem artifícios e subterfúgios e que entendem tudo ao pé da letra.

Quando ela veio para minha casa, eu estava de licença maternidade que emendei com um período de férias. Procurei ensiná-la a fazer algumas tarefas. Cozinhar, feijão e arroz toda mulher sabe. Quando queria uma refeição mais elaborada, eu ia para a cozinha.

Nos primeiros dias ela se assustou com a televisão, com o ruído do telefone, com o barulho da descarga do banheiro. À noite, eu mandava ela sentar junto com as crianças para assistir os programas de televisão. Rimos muito no dia em que ela respondeu ao boa-noite de Cid Moreira e ainda disse, toda desconfiada, Oxente, o homem se riu pra mim. Mesmo com todas as explicações que eu dava ela tinha dificuldade para entender.

Quando voltei a trabalhar expliquei as coisas principais e uma delas foi como atender o telefone. Olha, Quitéria, quando isto aqui tocar você pega e basta dizer: alô,  que do outro lado uma pessoa fala. Olhou-me desconfiada e foi preciso explicar mais de uma vez para que ela se dispusesse a pegar no aparelho.

Quando terminou a licença voltei ao trabalho. Sai sossegada porque minha sogra morava conosco e, apesar da idade, estava sempre atenta ao que acontecia.

No meio da tarde resolvi ligar para casa. Preocupada e com medo da leseira de Quitéria, toquei o telefone. Demorou um pouco e ela atendeu. Do outro lado um alô que mal pude escutar. Perguntei, bem alto, quem está falando? E ela, com espanto na voz: oxente, não é a senhora mesmo?

Obs: Texto retirado do livro da autora – Doido é quem tem juízo

A autora é poetisa,  escritora contistacronistaensaísta brasileira.

Faz parte da Academia de Artes e Letras de Pernambuco, Academia de Letras e Artes do Nordeste, Academia Recifense de Letras, Academia de Artes, Letras e Ciências de Olinda, Academia Pesqueirense de Letras e Artes , União Brasileira de Escritores – UBE – Seção Pernambuco
Autora dos livros: Em ponto morto (1980); A magia da serra (1996); Maldição do serviço doméstico e outras maldições (1998); A grande saga audaliana (1998); Olho do girassol (1999); Reescrevendo contos de fadas (2001); Memórias do vento (2003); Pecados de areia (2005); Deixe de ser besta (2006); A morte cega (2009). Saudade presa (2014)
Recebeu vários prêmios, entre os quais:

  • Prêmio Gervasio Fioravanti, da Academia Pernambucana de Letras, 1979
  • Prêmio Leda Carvalho, da Academia Pernambucana de Letras, 1981
  • Menção honrosa da Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1990
  • Prêmio Antônio de Brito Alves da Academia Pernambucana de Letras, 1998 e 1999
  • Prêmio Vânia Souto de Carvalho da Academia Pernambucana de Letras, 2000
  • Prêmio Vânia Souto de Carvalho da Academia Pernambucana de Letras, 2010
  • Prêmio Edmir Domingues da Academia Pernambucana de Letras, 2014
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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