Não fosse a inserção do ano de nascimento da autora, a impressão do leitor, ao concluir a leitura de Só mais uma vez, de Dulce Maria [São Paulo, Editora Arween, 2017, 268 pp], era de se cuidar de pessoa com mais de trinta anos, tal a maturidade do texto. Ledo engano. A autora só tem quinze anos. E daí o espanto que me tomou  conta após ler  o livro, primeiro, aliás, de Dulce Maria, pela segurança da condução dos fatos, pelo tom de  realidade conferido aos diálogos, pelo senso e equilíbrio da personagem narradora, e, ademais, por saber prender o leitor da primeira a última frase, preparando-o para o arremate, fincando em cada um o gérmen da curiosidade ante o segredo que impedia o personagem masculino de manter o namoro com a narradora.

Esse aspecto é importante, porque o texto, nos seus vinte e quatro capítulos e o epílogo, apresenta uma linha de uniformidade digno de uma veterana – e a autora, relembre-se, porta apenas quinze anos -, o que me proporciona a feliz conclusão de se tratar de uma vocacionada para as boas letras, saindo-se perfeitamente bem na primeira experiência levada às páginas de um livro, e, mais do que isso, na confecção de um romance, que, na sua extensão, não é de fácil edificação. No entanto, para Dulce Maria o foi, o que evidencia a intimidade da autora com a arte de escrever, valorizando mais ainda o seu Só mais uma vez.

Acrescente-se o perfeito banho-maria que a autora proporciona a partir do primeiro capítulo, técnica que pode conduzir a uma falsa monotonia, na fixação de aulas, de provas, de paqueras, de meninas que estudam, mas permanecem atentas aos rapazes, nos namoros tão próprios da idade, na paixão que a narradora vai sentir pelo personagem masculino principal, que, por outro lado, faz vistas grossas porque tem um segredo – olhe o segredo como tônica maior -, num chove e não se molhe que vai sendo conduzido devagarzinho, no avanço e recuo dos encontros e decepções, para, no último capítulo, bruscamente, a mansidão desaparecer, para dar lugar a um movimento que causa calafrios no leitor, pelo inusitado que acontece, e, nessa mudança de marcha e de velocidade, o veículo continua firme nas mãos de Dulce Maria, como se estivesse executando uma música clássica, partindo de um ritmo calmo para a alucinação de um final bem sincopado, deixando o leitor num suspense digno de um excelente filme, se constituindo, então,  na única parte do livro em que a autora, sozinha, domina a cena na narrativa das inesperadas ocorrências, tim por tim.

É justamente aí que o talento da jovem e estreante romancista atinge o pico da montanha, alicerçada num estilo simples, direto, sem atavios, segurando as rédeas do leitor até a explosão do planeta Terra, e, então e enfim, o segredo é desvendado, e, eu, pelo menos eu, passei alguns minutos entre o espanto e a admiração, nascendo a certeza de se tratar de uma estréia e tanto. Do título a gente aproveita para manifestar um desejo: Só mais uma vez, não. Que venham outras, outras tantas, ou seja, outros livros, porque talento em Dulce Maria não falta. O aperfeiçoamento é que virá com o tempo. ( 05 de agosto de 2017)

Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.   
  

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