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O querido amigo Alder Júlio, muito conhecido entre nós, divulgou, como tem feito sempre, o texto que segue. Alder é diácono casado, na querida Igreja da Paraíba, ministro particularmente dedicado ao anúncio da Palavra de Deus e de Suas exigências em nossa vida, particularmente em nossa prática política, em vista da superação do iníquo sistema capitalista, “economia assassina” que mata os pobres, como tem denunciado o Papa Francisco. O texto é o sermão pronunciado pelo Papa na celebração eucarística do domingo passado, dia 19 de Novembro, por ele proclamado “Jornada Mundial dos Pobres”. Lá pelo meio do ano, ao instituir a “Jornada Mundial dos Pobres”, o Papa divulgara linda mensagem, na qual reiterava que a Igreja de Cristo tem “opção fundamental pelos pobres”. Ou seja, não se trata apenas de “amor preferencial” e de cuidado especial com eles, como gostariam de afirmar alguns grupos e pessoas; não basta nem mesmo assumir “opção preferencial pelos pobres”, expressão contraditória em si mesma, pois “opção” não equivale simplesmente a “preferência”, são duas noções claramente diferentes. Nem se contenta o Papa com referir-se a “opção pelos pobres”, perspectiva tão cara e mesmo revolucionária, proclamada nas famosas Conferências de Medellín e de Puebla, representando oficialmente os episcopados católicos romanos de todo o nosso continente afro-ameríndio. O Papa, sem entrar na grave e acirrada polêmica que subjaz a toda essa diversificada terminologia, simplesmente e claramente, declara que a opção da Igreja pelos pobres é, na verdade, “opção fundamental pelos pobres”, a saber, acha-se nos fundamentos da Igreja. Não se trata apenas de gesto de compreensão e de bondade pastoral, não basta nem mesmo destacar os pobres como grupo privilegiado sob os cuidados da Igreja. Na verdade, assim como a Igreja tem Jesus como seu fundamento (cf. Fl 2, 1-11), junto com Ele ela tem os pobres, “reduzidos a escravos” como Ele mesmo, como chegou a dizer o próprio e insuspeito Papa Bento XVI. Sim, porque é inevitável, a não ser que se queime o Novo Testamento, Evangelhos e Epístolas dos Apóstolos. Os pobres constituem dimensão essencial e permanente dos fundamentos da Igreja. Trata-se de um daqueles “artigos” essenciais pelos quais a Igreja se mantém de pé ou desmorona e cai; como Lutero gostava de dizer “articula stantis aut cadentis Ecclesiae”, ou seja, a relação com os pobres é daquelas que faz a Igreja manter-se de pé, enquanto testemunha de Jesus; a ausência dessa relação revela a queda da Igreja, sua traição ao testemunho de Jesus. Sim, a “opção” da Igreja pelos pobres é “opção fundamental”, faz parte dos fundamentos, dos alicerces da Igreja, comunidade de Jesus, diz o Papa, na mensagem que institui a “Jornada Mundial dos Pobres”, também publicado neste blog há meses atrás.

———Homilia do Papa Francisco na Jornada Mundial dos Pobres ——–

O papa Francisco com os Pobres convidados a partilhar a refeição no Jornada Mundial dos Pobres – foto da internet.

“Temos a alegria de partilhar o pão da Palavra, e logo mais, de repartir e receber o Pão eucarístico, alimentos para todo o caminho da vida. Deles todos, sem excluir ninguém, temos necessidade, porque todos somos mendigos do essencial – do Amor de Deus, que nos dá o sentido da vida, e uma vida sem fim. Eis por que hoje Lhe estendemos a mão, para recebermos Seus dons.

Justamente acerca de dons, fala a parábola do Evangelho. Ela nos diz que somos destinatários dos talentos de Deus, conforme as capacidades de cada um. Primeiro que tudo, reconheçamos isto: nós temos talentos. Somos talentosos, aos olhos de Deus. Por isto, ninguém pode sentir-se inútil. Ninguém pode dizer-se tão pobre, que não possa dar algo aos outros. Somo escolhidos e abençoados por Deus, que deseja cumular-nos dos Seus dons, até mais que um pai e uma mãe desejam dar aos seus filhos. E Deus, a cujos olhos ninguém pode ser descartado, confia a cada um uma missão.

Com efeito, Pai amoroso e exigente como é, Ele nos dá responsabilidades. Vejamos que, na parábola, a cada servo são dados talentos para serem multiplicados. Mas, enquanto os dois primeiros realizam a missão, o terceiro servo não não faz frutificar os talentos. Devolve apenas o que havia recebido: “Tive medo – diz ele – e fui esconder o talento do Senhor debaixo da terra. Aqui está o que é do Sr.” Em troca, este servo recebe duras palavras: “mau e preguiçoso”. O quê, da parte dele, não terá agradado ao Senhor? Com uma palavra talvez um pouco em desuso, e no entanto muito atual, eu diria: a omissão: o mal dele foi o de não fazer o bem. Também nós, muitas vezes, achamos que não fazemos nada de errado, e com isto nos contentamos, presumindo sermos bons e justos. Assim agindo, corremos o risco de nos comportarmos como o servo mau. Aliás, ele também não fez “nada de errado”, não fez sumir o talento, antes o conservou bem, debaixo da terra. Só que não basta fazer nada de errado. Porque Deus não é um fiscal em busca de bilhetes não carimbados. É um Pai à procura de filhos a quem confiar Seus bens e Seus projetos. É triste quando um Pai, em relação ao amor oferecido, não recebe uma resposta generosa de amor, da parte dos filhos, que se limitam a respeitar as regras, a cumprir os mandamentos, como assalariados na casa do Pai.

O servo mau, não obstante o talento recebido do Senhor, que ama compartilhar e multiplicar os dons, guardou-o caprichosamente, contentou-se com conservá-lo. Mas, não é fiel a Deus quem se preocupa apenas em conservar, em manter tesouros do passado. Ao contrário, diz a parábola aquele que reúne talentos novos, é verdadeiramente fiel, porque tem a mesma mentalidade de Deus, e não fica imóvel: arrisca-se por amor, põe sua vida em jogo pelos outros. Não aceita deixar tudo como se acha – imóvel: Só uma coisa deixa para lá: o próprio interesse. Esta é a única omissão justa.

A omissão também é o grande pecado nos embates contra os pobres. Aqui, ela assume um nome preciso: indiferença. Isto é: “Isto não me diz respeito. Não é assunto meu. É culpa da sociedade.” É virar o rosto, quando o irmão está em necessidade, é mudar de canal, quando uma questão séria nos incomoda. É também indignar-se diante do mal, sem nada fazer. Mas, Deus não nos perguntará se teremos sentido uma justa indignação, mas se fizemos o bem.

Então, como podemos corretamente agradar a Deus? Quando se quer agradar a uma pessoa querida, dando-lhe, por exemplo, um presente, precisamos antes saber seus gostos, a fim de evitar que o presente seja mais agradável a quem o oferece do que a quem o recebe. Quando quisermos oferecer alguma coisa ao Senhor, vamos encontrar Seus gostos no Evangelho. De repente, após a passagem que hoje ouvimos, Ele diz: “Tudo o que vocês fizerem a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim o fizeram.” Estes irmãos mais pequeninos, que Ele tem como Seus prediletos, são o que passa fome, o enfermo, o estrangeiro, o encarcerado, o pobre, o abandonado, o sofredor sem ajuda e o necessitado, o descartado. Sobre os seus semblantes podemos imaginar estar impresso o Seu rosto; sobre os lábios deles, ainda que fechados por conta da dor, Suas palavras: “Este é o Meu corpo!”. Nos pobres, Jesus bate ao nosso coração, e, sedento, nos pede amor. Quando vencemos a indiferença, e, em nome de Jesus, nos gastamos por Seus irmãos mais pequeninos, somos Seus amigos bons e fiéis, com quem Ele gosta de entreter-Se. Deus o preza muito, preza a atitude que que escutamos na primeira Leitura, a da “mulher forte” que abre suas mãos ao miserável, estende a mão ao pobre. Eis a verdadeira fortaleza: nada de punhos cerrados, nada de braços cruzados, mas mãos operosas e estendidas em direção aos pobres, em direção à carne ferida do Senhor.

Aí, nos pobres, se manifesta a presença de Jesus, que de rico, Se fez pobre. Por isto, neles, em sua fragilidade, há uma força salvífica. E, se aos olhos do mundo, eles têm pouco valor, são eles que nos abrem o caminho para o céu, eles são o nosso passaporte ao paraíso. Para nós, é dever evangélico cuidarmos deles, que são nossa verdadeira riqueza. E fazendo isto, não só dando pão, mas também partilhando com eles a Palavra, da qual eles são os destinatários mais naturais. Amar o pobre significa lutar contra todas as pobrezas, espirituais e materiais.

E nos fará bem: acercar-nos de quem é mais pobre do que nós. Tocará nossa vida. Vai recordar-nos do que realmente conta: amar a Deus e ao próximo. Só isto dura para sempre. Todo o resto passa. Por isto, o que investimos em amor, permanece. O resto evapora. Que hoje possamos nos perguntar: para mim, o que conta na vida, onde invisto? Na riqueza que passa, e de que o mundo nunca se satisfaz, ou na riqueza de Deus, que dá a vida eterna? Esta escolha se acha diante de nós: viver para ter uma terra, ou dar para ganhar o céu? Porque para o céu, não vale o que se tem, mas o que se dá, e quem acumula tesouros para si, não enriquece aos olhos de Deus. Então, não busquemos o supérfluo para nós, mas o bem para os outros, e nada de precioso nos faltará.

Que o Senhor, que tem compaixão de nossas pobrezas, e nos reveste de Seus talentos, nos dê a sabedoria para buscarmos o que conta, e coragem para amar, não por palavras, mas com fatos.”

Obs: O Autor é Bispo Emérito da Diocese Anglicana do Recife
Igreja Episcopal Anglicana do Brasil – IEAB….

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Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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