No edifício onde moro há uma horta. Minto. Há duas. A idéia, aliás, feliz idéia, partiu de um motorista, de extinguir os dois jardins, para, em lugar das plantas, se fazer uma horta. É verdade que são pequenas, espaço curto, aproveitando-se toda a área para se plantar sempre uma verdura a mais, inclusive coentro, verduras que são aproveitadas por todos que se dispõe a descer e lá, no momento certo, colher o que necessita e o que se torna útil a panela do dia a dia.

Eu bato palmos para quem teve a idéia e, igualmente, para quem deu o consentimento, porque a horta é uma saudável realidade, as verduras ocupando o espaço que, anteriormente, eram das plantas, aliás, bem bonitas, mas sem utilidade prática, ao contrário da horta, que produz e coloca na panela do condômino a viçosa verdura que é cultivada, a terra bem tratada, os bafejos diários que recebe, a experiência de quem está a revolvê-la sempre, a fim de  que a verdura possa sair da semente e crescer, para a alegria e regozijo do prato de todos nós, moradores do edifício.

De minha parte, inspirado em duas pimenteiras lá erguidas, uma das quais se assemelha, a primeira vista, com a pimenta de cheiro, mas de cheiro não é – muitos já se enganaram -, levei três mudas de pimenta malagueta. Duas foram para a frente, uma, coitada, morreu, aprisionada na caixa onde foi fincada, sem espaço para as raízes crescerem. Mas as sobreviventes, enfiadas no chão fértil – nesse solo onde plantando tudo dá, como diria Pero Vaz Caminha – vão bem, obrigado, crescendo, o verde das folhas escondendo as pimentas que já nascem, ainda na transformação da flor no fruto, na absoluta expectativa de, mais algumas semanas, o vermelho tomar conta de cada fruto, e as pimentas, enfim, poderem participar de um molho, para os que dele se utilizam em seus almoços. As pimenteiras crescem, portanto, sob as minhas vistas, no final de semana, a verificar o tamanho de cada uma, as pimentas que ainda se escondem no verde, preso a velha e correta verdade, tão corriqueira na propriedade rural, de que o gado só engorda aos olhos do dono.

Pois sim. O espaço é curto e diminuto, aumentando de tamanho pela habilidade dos que dele cuidam, no aproveitamento de toda a área, no cultivo de verduras e no predomínio do verde, plantando para se colher. E eu, que não posso ver uma árvore a minha frente para não pensar no fruto que produz e no que deixa de produzir, que acredito que no meu céu haverá umbuzeiros, mangueiras e mangabeiras, me deixo inundar do verde de cada verdura, inclusive da pimenta, para sonhar com um espaço maior onde a horta seria mais variada ainda, para a serventia de todos nós.

A criação de uma horta no edifício não foi registrada em cartório. Daí todos os demais edifícios poder abrir uma também, sem violação do direito autoral.

Oxalá assim façam! (10 de junho de 2017)

Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.   

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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