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Há poucos dias, entrou em vigor no Brasil o que o governo chama de “Reforma Trabalhista” que dá razão ao multimilionário americano que declarou: “A guerra de classes existe e finalmente a minha ganhou”. No Brasil, foi para garantir essa vitória do Capital financeiro sobre as classes trabalhadoras que os poderosos se uniram, adaptaram para si todas as leis e realizam hoje as diversas reformas necessárias para garantir o domínio absoluto do mercado. Esse modelo de desenvolvimento atualiza quase ao pé da letra um antigo mito grego. Esse falava do rei Midas que transformava em ouro tudo o que tocava. Hoje, os capitalistas transformam a terra e a água em mercadorias. O trabalhador se transforma em mão de obra ou recursos humanos. E até a guerra se torna fonte de lucro. As consequências disso são o aquecimento da temperatura, a desertificação da Terra, a água contaminada e a própria vida ameaçada de extinção.

Em reação a isso, cada vez, aumenta o número de comunidades e movimentos humanitários no mundo que insistem em contestar esse dogma do pensamento único e mostrar que outro modo de organizar o mundo não somente é necessário, como é possível e urgente. No Brasil, a Associação Brasileira das Organizações Não Governamentais (ABONG) instituiu o que chamou de “Banco de Práticas Alternativas” (Ver www.observatoriosc.org.br) Concretamente, essa iniciativa reúne experiências de comunidades que realizam experiências alternativas de economia solidária e comunitária que têm dado certo. Quem entrar no site da internet descobrirá mais de 80 experiências belas e profundas nos campos da agricultura, da gestão comunitária e da convivência com a Terra.

No cotidiano das cidades, na Europa e na América Latina, diversas entidades procuram desenvolver nas pessoas  o hábito do “consumo crítico”. Ao contrário do que pregava um ministro da economia do tempo da ditadura brasileira, dinheiro tem cheiro, cor e sabor. Tem até coração. Pode ser instrumento de misericórdia ou ser provocador de morte. Quem compra um produto ou consome uma marca deve verificar se a empresa que a produz respeita os direitos dos trabalhadores ou se explora o trabalho infantil, ou ganha dinheiro com a venda de armas e com a destruição da natureza.

Mísseis nucleares que, em uma fração de segundos, podem destruir a humanidade e a Terra, são produzidos pela mesma General Eletric de nossas lâmpadas caseiras. O combustível para o exército americano matar inocentes nos diversos países que invade é fornecido pela Esso, empresa que também abastece de gasolina nossos carros. E é com o dinheiro ganho de seus milhões de pequenos clientes como nós que ela acumula dinheiro e poder para ser fornecedora dos aviões militares. As empresas mineradoras que destroem a Amazônia e provoca o envenenamento dos rios nos diversos continentes são as mesmas que vendem as pratas e joias nos shoppings de nossas cidades.

Se essas empresas e todas que apoiam guerras, ignoram a justiça social e provocam destruição ecológica souberem que a sociedade civil consciente não comprará mais seus produtos, serão obrigadas a mudar.

Há décadas que Hollywood invade o mundo com filmes de terror barato, como a antiga série “Brinquedo Assassino”. Nesses filmes, à noite, quando as portas das lojas de brinquedo se fecham, um simples boneco de plástico ganha alma e aprisiona ou mesmo assassina seus usuários. Apesar do mau gosto, parece parábola desta sociedade na qual mercadorias aprisionam afetiva e economicamente seus consumidores e nos impõem um tipo de sociedade que não queremos. E como o aprendiz de feiticeiro da antiga lenda, as pessoas sabem acionar computadores, navegar na Internet, investir suas poupanças, mas não parecem saber como recuperar a natureza ferida e restituir vida a multidões ameaçadas pela morte.

A maioria das religiões antigas valoriza o jejum e a abstinência como instrumentos de purificação interior e educação do auto-domínio. Os antigos pais da Igreja ensinavam: tudo o que sobra em nossa mesa e na casa pertence de direito a quem precisa daquilo para viver. Está na hora das pessoas e grupos que amam a Paz e crêem no Amor se reorganizarem. É urgente fortalecer e mobilizar, o mais possível, a sociedade civil. E tanto por uma postura de sanidade espiritual como por profecia sócio-política  intensificar o consumo crítico e um modo de viver mais justo e sadio. Na sua encíclica sobre o cuidado com a Terra, nossa casa comum, o papa Francisco nos pede uma verdadeira “conversão ecológica“.  No ano passado, ele instituiu o dia 19 de novembro como “dia mundial dos pobres”. Para esse ano, foi escolhido o tema: “Não amemos somente com palavras”. O amor exige mudança de atitudes na direção da solidariedade.  De fato, segundo o evangelho, Jesus nos diz: “Onde estiver o teu tesouro, aí estará também o teu coração” ( Mt 6, 21).

Obs: O autor é monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares.
É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.  

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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