Outrora aquela casa era puro movimento: finais de semana festivos, muitos amigos, bebidas e comida em abundância.
Gargalhadas e sorrisos fartos.
Conversas animadas.
Histórias e estórias eram narradas, comentadas.
Todos pareciam animados.
A música permeava sempre aquela ginástica léxica: ora se elevava ora diminuía seu tom.
As crianças estavam libertas de suas obrigações semanais.
Corriam, brincavam, pulavam como se fossem animaizinhos livres.
Ninguém as importunava.
Eram detentoras do poder e da liberdade.
Uma folia sem tradução.
Apenas ela, a dona da casa, ausentava-se muitas vezes daquela alegria e se recolhia aos seus aposentos para suas leituras.
Sentia- se descontextualizada.
Preferia estar só, no silêncio da sua quietude.
O tempo se diluía, assim como todos dali.
A criança crescia.
Os jovens surgiam.
As separações eram inevitáveis.
Nesse passar temporal as pessoas se foram, restou apenas ela e a casa.
A sala tornou-se calma, desértica e indesejada.
Os quartos continuaram imóveis e sepulcrais.
Sempre impecáveis: camas feitas, colchas engomadas, parquet brilhante, livros enfileirados nas prateleiras, tapetes belgas retratando flores sem vida.
Janelas cerradas e cortinas fechadas para que a poeira não entre, assim como a vida também.
Espaços vazios que parecem preservar o sinistro e fantasmagórico do hoje.
Ausência humana, invasão do nada aos borbotões.
A tristeza fez morada lenta e progressivamente.
A casa envelheceu.
Hoje moribunda, junta- se a sua dona, perdida em devaneios, aflições e abandono.
As imagens vitrificam- se, congelam – se no tempo.
Ontem… tão distantes. Hoje infinitamente presentes.
A casa chora.
Sua dona enlouquece.
Ninguém se apercebe.
A morte ronda a casa, apodera-se de sua proprietária.
Agora é o nada.
Obs: Imagem enviada pela autora (retirada do Google)