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Ao consagrar o 1º de outubro como “dia internacional das pessoas idosas”, a ONU quis responder a dois desafios. O primeiro é o envelhecimento da população. Atualmente, na maioria dos continentes, diminui a taxa de nascimentos. Ao mesmo tempo, a medicina prolonga a média de vida das pessoas. A ONU considera alguém idoso se a pessoa tiver mais de 65 anos ou, em países mais empobrecidos, ao menos 60. Segundo os organismos internacionais, até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas. Cada vez é mais frequente conhecermos homens e mulheres na faixa de cem anos. Não parece mais atual a palavra do salmo que afirmava: “Setenta anos é a duração de nossas vidas. Oitenta, se somos fortes” (Sl 90). Aí se junta o segundo desafio: Ao contrário das culturas antigas que veneram os idosos, a sociedade capitalista só valoriza quem está na idade de produzir e comprar. Frequentemente, os mais velhos se sentem marginalizados e condenados a se tornarem cada vez mais dependentes. Por isso, ao instituir o dia das pessoas idosas, a ONU propõe como direito de todos os idosos, acesso aos cuidados de saúde, possibilidades reais de integração social e direito às informações e à educação permanente.
Todos nós, mais velhos ou mais jovens, somos como cristais belos, mas frágeis. Um pequeno descuido ou um passo em falso e tudo pode acabar. Não bastasse isso e, como diz Zigmunt Bauman, a própria sociedade parece se liquidificar. As relações sociais se tornam fluidas, laços familiares facilmente se desfazem e a própria vida se revela precária.
Ninguém gosta de envelhecer. Propagandas sobre a “melhor idade” só atingem quem não sabe o que significa sentir, de repente, ou aos poucos, o corpo cada vez mais frágil e enrugado. Ninguém gosta de ver suas forças físicas, a memória e a agilidade mental diminuírem. Só mesmo uma profunda estabilidade interior pode dar equilíbrio e garantir a paz.
Nas culturas afrodescendentes e indígenas, as pessoas mais velhas são vistas como portadoras da sabedoria do Espírito. De acordo com a Bíblia, a aliança de Deus com os pequenos e marginalizados do mundo começou com Abraão. Com mais de 80 anos, ele era patriarca de um clã de lavradores sem-terra. Escutou uma palavra divina para sair de si mesmo, de sua cultura, do seu ambiente clânico e partir. Assim, ele iniciou uma caminhada em busca de uma terra livre e de uma descendência numerosa. Abraão era casado com Sara, mulher velha e estéril. Deus tornou a sua velhice abençoada e seu casamento fecundo. Ao comentar esses textos antigos, o apóstolo Paulo escreve que, assim como Deus fez nascer uma vida nova do corpo já amortecido de Abraão, Ele ressuscita Jesus e dá a todos nós que cremos, uma vida nova (Rm 4, 19- 22).
Conforme o evangelho de Lucas, quando os pais levaram Jesus, recém-nascido para, conforme a lei judaica, apresentá-lo no templo, ele foi acolhido por Simeão e Ana, dois anciãos, profetas que souberam reconhecer quem era aquela criança. Através daquele menino, eles anunciaram uma nova esperança de libertação para o povo de Israel e para toda a humanidade (Cf. Lc 2, 25 ss). Também hoje, pelas condições especiais de sua idade, as pessoas idosas são portadoras de um apelo de mais humanidade para todos.
Obs: O autor é monge beneditino e teólogo católico é especializado em Bíblia e assessor nacional do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares.
É coordenador latino-americano da ASETT (Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo) e autor de 45 livros publicados no Brasil e em outros países.