Padre Beto 1 de setembro de 2017

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Um professor é transferido para uma rígida instituição de reeducação de jovens meninos. Se colocando contra a filosofia da escola, o professor, com paciência, tenta melhorar, através da música, a educação dos jovens. O que parece absurdo para a direção se torna um milagre na vida daquelas crianças fazendo com que elas resgatem sua autoestima e sua dignidade. Uma verdadeira lição de vida, o filme “A Voz do Coração”, de Christophe Barratier, nos mostra a dualidade entre a luta pelo poder e o interesse descomprometido pela vida do ser humano. Mais do que isso, no filme percebemos a diferença entre a autoridade estabelecida pela lei e a autoridade que surge da autenticidade.

O conflito entre Jesus e os sacerdotes ou anciãos de sua época se constituía em uma luta entre uma liderança autêntica (Jesus) e o poder legitimado pela lei (sacerdotes e anciãos). Jesus se torna a “pedra recusada” pelos líderes porque incomodava o poder religioso e político da época devido ao seu carisma, a sua popularidade e autenticidade. Em outras palavras, Jesus possuía uma verdadeira autoridade. A verdadeira autoridade não é imposta por lei, função ou cargo, mas nasce da coerência entre discurso e prática de vida. O que faltava para os detentores do poder da época era, na verdade, um verdadeiro processo de conversão. Somente a conversão leva à coerência de vida e, por sua vez, à conquista da autoridade. Conversão significa um autoconhecimento constante e cada vez mais profundo. Nele inclui não somente o conhecimento de nossas qualidades, daquilo que somos capazes, mas principalmente o esforço em desenvolver estas qualidades. As qualidades não devem ficar nos sonhos, ou somente no reconhecimento intelectual, mas devem se realizar, tornarem-se reais e movimentar a vida. Caso contrário, não temos um verdadeiro processo de conversão. Neste autoconhecimento, porém, devo também reconhecer meus defeitos e ter um encontro desagradável com minhas sombras. Se não encaramos nossos defeitos duas consequências acontecem: eles se tornam fantasmas que irão nos acompanhar durante toda a nossa existência e transferimos estes defeitos aos outros. Quando não admitimos nossos erros eles se tornam fantasmas para nós mesmos e, graças ao nosso egocentrismo, temos a tendência de transferi-los a outras pessoas. Geralmente, as pessoas que nos incomodam demasiadamente com um defeito ou uma qualidade são pessoas que possuem características muito próximas das nossas ou qualidades que também possuímos, mas não temos coragem de desenvolver. A inveja, por exemplo, é sintoma do desejo que temos em desenvolver uma qualidade que outra pessoa teve a coragem de concretizar. Em relação aos defeitos não é diferente. Na verdade, nos irritamos demais com os outros porque, no fundo, o defeito está em nós. Nós é que somos o erro. Não que a outra pessoa não tenha defeitos, mas quando estes me incomodam demasiadamente isso é sinal de que estou me olhando no espelho através de outra pessoa.

A questão  é: como trabalhar um defeito? O caminho de conversão nos propõe desenvolver a qualidade oposta ao defeito, pois o defeito na verdade não existe, ele é a falta de uma qualidade não desenvolvida. Se não faço, se não sou, eu tenho a tendência de criticar quem faz ou quem é. Se faço ou sou, vejo no outro, que também faz e que também é, um semelhante, alguém com quem posso somar. Desenvolvendo minhas qualidades o outro deixa de ser uma ameaça e passa a ser um semelhante, um irmão. A paz de Deus é conseguida aqui na realização do que sou e concretizando o que sonho. Se caminho desta forma, aconteça o que acontecer, estarei com uma paz inexplicável, que é a Presença de Deus em minha vida. Justamente aqui está o paradoxo religioso. Se deixo de ter atitudes concretas e coerentes que me parecem corretas, fico aguardando que Deus realize algo por mim. Mas Deus realiza comigo a partir do momento que começo a dar o primeiro passo, quando deixo de ser uma máscara e passo a ser transparente e autêntico. Em primeiro lugar, porém, está a disposição de ser concretamente e sinceramente na existência. A partir daí, sou possuído pelo Espírito Divino da Vida que me dá coragem de concretizar aquilo que tenho como ideal. Nós não somos admirados ao tentar agradar a todos ou por estarmos revestidos de uma autoridade legal, mas somos admirados quando, apesar de tudo, agimos com honestidade, com coerência e transparência. Desta forma, podemos até ser crucificados, mas ressuscitamos no terceiro dia. Afinal, como afirma um ditado judeu: nenhum assaltante ataca uma carroça de estrume, mas somente uma carroça que transporta tesouros.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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