Ronaldo Coelho Teixeira 1 de setembro de 2017

Para Moacyr Scliar (1937-2011)

[email protected]
http://ronaldoteixeira.arteblog.com.br/
http://ronaldo.teixeira.zip.net/
http://lounge.obviousmag.org/espantalho_lirico/

O humano é tudo de mais precioso nessa nossa vida. É só você puxar pelas melhores coisas, os mais fantásticos momentos de sua vida, as grandes alegrias e, o mais importante de tudo: quando você chegou naquele momento difícil, quase sem saída, quem lhe mostrou que havia uma boa possibilidade? Um ser humano.

Essa introdução é só para lembrar de uma pessoa por demais humana que partiu há pouco. Trata-se do gaúcho, médico e escritor Moacyr Scliar, que nasceu no dia 27 de fevereiro de 1937. Confesso que nunca fui grande fã do estilo de sua escrita. Mas um livro de sua autoria me perseguia há anos. Falo de “Saturno nos Trópicos – A Melancolia Européia Chega ao Brasil”, obra na qual o autor disseca (e o trocadilho nada tem a ver com a sua profissão) esse estado da alma, esse complexo sentimento humano, com erudição e clareza, apoiando-se na história das grandes descobertas científicas e também em grandes clássicos da literatura mundial, a exemplo de Cervantes, Shakespeare, Machado de Assis e Lima Barreto. Mas, acima de tudo, realizando uma obra única com o seu talento literário.

E quando falei do humano no início desta, conto agora como o conheci (virtualmente?). Era o ano de 2004, trabalhava como jornalista no programa ambiental de comunicação da Enerpeixe, em Peixe, Tocantins, empresa responsável pela construção do Aproveitamento Hidrelétrico Peixe-Angical. Como havia necessidade de ficar por dentro do Movimento dos Atingidos por Barragens, o MAB, acabei encontrando via internet, o sítio www.agenciacartamaior.com.br.

Mas, ali, encontrei também bons artigos diversos, poesia e literatura, além do jornalismo, com grandes nomes nacionais das nossas letras. E entre estes, Moacyr Scliar assinava semanalmente uma crônica na seção de Arte e Cultura. Outra gaúcha também de renome, Martha Medeiros, também escrevia crônicas, mas ia deixar o posto em face de contrato com uma nova editora. Aproveitei e enviei três de minha autoria para o editor Eduardo Carvalho. Resultado: acabei substituindo ela por quase dois anos.

Depois, em 2006, atuando como coordenador artístico e cultural da Fundação Cultural de Gurupi, cheguei a convidá-lo para participar da 2ª Feira do Livro de Gurupi – FELIG, que a incansável amiga e então presidente da Fundação, Lucirez Amaral, havia criada. Fiz contato via seu site e ele, sempre atencioso, afirmou que já tinha compromisso, estaria na Feira do Livro de Roma, na Itália.

A partir dali, passamos a ter um mínimo de contato virtual. Logo depois, em 2007, lancei o livro de crônicas “Surtos & Sustos”, convidando-o para prefaciar o mesmo, o qual, com bastante carinho e atenção, concordou e o fez. Mesmo o livro contendo um texto no qual eu discordava do Movimento Literatura Urgente, encabeçado por grandes nomes da literatura nacional, inclusive, pelo próprio Scliar. Mas, dando provas do quanto gigante ser humano ele era, ainda enviou-me depois, o citado livro sobre a melancolia, com autógrafo e tudo. Claro, depois disso, acabei me interessando mais pelos seus livros e terminei lendo outros títulos seus.

De vez em quando, nós trocávamos e-mails. E eu acompanhava o seu frágil estado de saúde desde o início de 2011. E aí, num domingo, 27 de fevereiro, quem me liga para avisar de sua morte foi outro grande ser humano: o maestro Othonio Benvenuto. Depois de me desculpar – como sempre fazemos – dizendo que lhe devia uma visita (pois este também teve um problema de saúde parecido com o do Moacyr Scliar, e estava se recuperando), alegando as mesmas muletas de sempre: correria, falta de tempo, etc. Detalhe: Benvenuto é amigo pessoal da irmã do escritor, Ester Scliar.

É isso! Sou humano, somos humanos, mas parece que quase sempre não nos damos conta disso. Passamos a vida atropelando a nós mesmos e aos outros e, o que é pior, geralmente aqueles a quem mais amamos, em nome de quê mesmo? Não, não existem desculpas, não existem culpados. Tudo começa e termina em cada um de nós. Por isso, agradeço a você, Moacyr Scliar, e a você, grande maestro, pela generosidade concedida a mim, deixando aqui apenas uma palavra final: gratidão.

Obs: Imagem enviada pelo autor (Ilustração: Moacyr Scliar por Amarildo)

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


busca
autores

Autores

biblioteca

Biblioteca

Entrelaços do Coração é uma revista online e sem fins lucrativos compartilhada por diversos autores. Neste espaço, você encontra várias vertentes da literatura: atualidades, crônicas, reportagens, contos, poesias, fotografias, entre outros. Não há linha específica a ser seguida, pois acreditamos que a unidade do SER é buscada na multiplicidade de ideias, sonhos, projetos. Cada autor assume inteira responsabilidade sobre o conteúdo, não representando necessariamente a linha editorial dos demais.
Poemas Silenciosos

Flickr do (Entre)laços
[slickr-flickr type=slideshow]