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(para Dostoiévski – 1821-1881)
Sou um homem doente,
perverso
e nada atraente.
Supersticioso,
apesar da instrução
para não sê-lo.
Sabedor de que,
ser consciente demais
é uma doença.
E que, mesmo o desespero,
tem os prazeres mais ardentes.
E se a civilização não me tornou
mais sanguinário,
ao menos, mais vil do que antes,
ela me fez.
Indomável,
sei que o homem não necessita
de uma vontade proveitosa e virtuosa,
mas apenas de uma vontade independente.
Sei também
que da história universal
pode-se dizer tudo,
menos que ela possua alguma sensatez.
Leviano e desonesto,
como os demais homens,
porque aprecio apenas o processo
de obtenção do objetivo,
mas não o objetivo em si.
Recuso o sofrimento, a destruição e o caos,
porque sei ainda que a consciência
é filha do sofrimento.
Sou um covarde e um escravo,
porque carrego o título
de homem honesto desse nosso tempo.
Como os demais,
dessacralizo o Amor quando insisto
em exibi-lo gratuitamente,
esquecendo que ele é um santo segredo divino,
e, como tal, deve ficar longe dos olhos de todos.
Me mascaro
na zombaria proposital,
– reduto habitual dos acanhados
e de coração casto – ancorado no orgulho
e temeroso em exprimir meus sentimentos.
E a tirania louvável que há no mundo
nunca a compreendi,
porque nunca fui tiranizado
pelo objeto amado.
Talvez, por isto,
essa dúvida cruel que não me larga:
ter uma felicidade barata
ou um sofrimento elevado.
Sigo,
tendo repulsa pela verdadeira existência,
a vida viva,
porque fui desacostumado à ela.
E temo o dia
em que minhas mãos forem desatadas
e a liberdade escancarada me assustar,
fazendo com que eu volte a implorar
pela dependência.
Por tudo isso,
indomável,
continuo aqui nesse subsolo,
sonhando com a superfície.
Obs: Imagem enviada pelo autor (Ilustração: Osvaldo Goeldi)