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Mais uma vez ler um artigo de Frei Betto me inspira a escrever sobre o mesmo tema. Isso começou em 1998 e dura até hoje. Talvez essa mania se explique pelo fato dele escrever as coisas que eu concordo e que assinaria embaixo. Talvez seja algo entre mestre e discípulo. Essas coisas que ligam as pessoas por suas ideias, por suas pregações, por seus exemplos de vida.

Da primeira vez foram os dinossauros que me inspiraram. Dessa vez, foram as mulheres. O artigo que me inspirou agora foi: APÓSTOLAS, PIONEIRAS DO FEMINISMO, postado no blog o Porta-Voz em 04 de maio de 2017: http://jornaloporta-voz.blogspot.com.br/2017/05/apostolas-pioneiras-do-feminismo.html

Em seu artigo Frei Betto questiona por que as mulheres não foram chamadas de apóstolas, na bíblia, se a primeira pessoa para quem Jesus se revelou o Messias foi à mulher samaritana e a primeira pessoa que o viu após a ressureição  o reconheceu foi Maria Madalena. Talvez por questões supostamente moralistas? A primeira estava em seu quinto relacionamento matrimonial e a segunda era adúltera?

Mas não teria sido exatamente esse o ponto que Jesus queria mostrar? Que a Ele não importava se a pessoa era homem ou mulher, se estava dentro dos padrões morais da época ou não. Ele simplesmente se revelou a elas. E isso não é valorizado, nem na Bíblia, nem na Igreja Católica, que é que tenho conhecimento para falar. Na Igreja Católica, como na vida, as mulheres continuam sendo seres de segunda categoria. São úteis para cuidar das flores, dos panos do altar, das velas, podem ser freiras, mas não podem celebrar uma eucaristia, consagrar o pão e o vinho, ministrar sacramentos. Não poderão ser bispas ou cardeais. Jamais ocuparão a cadeira de Pedro.

Os defensores da supremacia masculina dizem que foi assim desde os primórdios e que não é agora que vai mudar. Justificam a posição de primeira classe dos homens com o fato deles terem sido sempre os provedores, que no tempo das cavernas arriscavam a vida indo à caça, enquanto as mulheres ficavam cuidando das crianças e, pasmem, chegaram a dizer que “ficavam fofocando”. O que esqueceram de mencionar é que, enquanto os homens iam atrás da caça, as mulheres pegavam sua crianças e iam em busca de frutos e raízes que pudessem alimentar as famílias, quando os homens voltassem de mãos vazias ou com pouca caça. E aí é que talvez, realmente, tenha começado essa história de sermos de segunda classe. Provavelmente em lugar de ficarem agradecidos às mulheres por terem providenciado alimento para suprir o seu fracasso, os homens ficavam com raiva por elas serem criativas e eficientes e colocavam a atitude delas como uma obrigação em diminuir o vexame da ausência de caça. Porque, se formos analisar friamente, qual tem sido o papel das mulheres esses milhares de ano? Tapar os buracos que os homens vão deixando ao longo do caminho. E, em lugar de valorizarem o seu papel, fundamental na manutenção da vida propriamente dita, foram se colocando em segundo plano, como se a sua missão de vida fosse apenas servir: primeiro ao pai e depois ao marido e aos filhos. E, com o passar do tempo, as obrigações foram aumentando, como por exemplo ter que se manter bonita e cheirosa para quando o marido chegar em casa após um longo dia de trabalho. Como se só os homens trabalhassem. Como se o trabalho doméstico fosse leve. Como se educar os filhos, sem precisar lançar mão de um chinelo ou cinturão, fosse fácil.

Sou da geração que teve o privilégio de ser adolescente na chamada “Era Hippie”, quando se iniciou a revolução sexual, quando o “faça amor não faça a guerra” começou a se espalhar e a despertar as mulheres para o fato de que os papeis principais também eram seus. Que, finalmente, tinha chegado a hora de deixar de ser apenas figurante, coadjuvante, degrau para que os homens subissem as escadas.

Nascida em uma família bastante machista, desde cedo compreendi que aquilo estava errado. Nenhuma mulher tinha obrigação de adivinhar o que o marido queria comer no café da manhã. Se ele sabia falar, então que dissesse o que queria. Quando eu era jovem, ainda se olhava com preconceito para as mulheres que tinham filhos e trabalhavam fora. E eu, às vezes, era olhada com desaprovação, quando, em alguma festa ou reunião, era a única que não era “do lar”.

Ao longo da minha vida ouvi comentários do tipo: “não perturbe seu marido com os problemas das crianças. Quando meus filhos eram pequenos e o pai chegava em casa, os problemas acabavam. Os homens precisam de sossego quando chegam em casa”.  Ou ainda: “Não discorde de seu marido na frente dos outros. Isso humilha ele. Não desminta nunca. Os homens não gostam de ser contrariados. Principalmente na frente de outros homens”.

Outro tipo de comentário que sempre me chocou e, confesso, me dava muita raiva, era do tipo que ouvi várias vezes quando, por divisão de tarefas em final de semana de férias, era a vez dos homens cozinhar e lavar os pratos: “Tadinhos deles. Fico com pena deles fazendo isso”. Pois é, mulheres mais velhas faziam esse comentário. Tinham pena dos homens lavando os pratos. Mas não de nós quando fazíamos isso.  Ficavam solidárias porque era um sacrifício que eles estavam fazendo. E nós, quando lavamos prato? Achamos divertido? É uma bênção que os céus nos dão?

E, finalizando os comentários bizarros, uma pérola, que ninguém merece ouvir, quando perguntei a uma jovem, por que ela não tirava carteira de motorista e ela me respondeu, na maior tranquilidade que o namorado não deixava. Claro que isso foi há uns vinte e poucos anos. Mas vocês acham que hoje em dia não têm mais garotas alienadas assim? Quem dera!!

Mas, ainda bem que eu não sou carneirinho nem vaca de presépio. Todo NÃO recebido precisava de uma explicação. Todo avanço pedia ousadia, embora, às vezes, terminasse em castigo. Mas, com certeza, os prêmios sempre valiam as punições.

E chegamos aos tempos de hoje, século XXI, terceiro milênio, tecnologia a todo vapor e os avanços sociais … em marcha ré. Pelo menos aqui no Brasil.

Quando comparamos o comportamento natural dos homens em países socialmente desenvolvidos como o Canadá ou a Noruega, por exemplo, com o do homem brasileiro típico, dá um desânimo e a sensação de ter nascido no país errado.

Em países onde, de verdade, a igualdade de gênero existe, não tem essa de homem ajudar nos serviços domésticos ou no cuidado dos filhos. Existe a divisão de tarefas. Porque a casa e os filhos são dos dois. Então tudo é obrigação dos dois. Daí existir divisão de obrigações e não esse papo furado de “ajuda”, como se fosse um favor.

Nesses países, os pratos não se acumulam na pia, marotamente, na esperança que a mulher não aguente mais e lave. As obrigações são levadas a sério e, lavar prato ou limpar fralda de cocô não é tarefa exclusiva das mulheres. Acredito que ninguém goste de tarefas domésticas. Mas elas existem e precisam ser feitas. Então que sejam divididas e não colocadas nos ombros das mulheres. Que, aliás, vale salientar, no Brasil têm múltiplas tarefas: trabalham fora, são donas de casa, mães e esposas. E têm que se esforçar para fazer tudo com esmero e brilhantismo. Se o marido a trair, a culpa será dela que não soube prender o marido e o coitado precisava se virar, afinal ninguém é de ferro, a carne é fraca e blá blá blá… Agora se a mulher trair o marido é uma vagabunda.

Não somo seres de segunda categoria. Não somos coadjuvantes. Não somos propriedade de ninguém. Somos mulheres, seres humanos da melhor qualidade, que gera a vida dentro de si e de quem depende a continuidade da espécie humana.

Da próxima vez que encontrar a pia cheia de pratos e copos sujos, dê meia volte e beba água na xícara, no cálice de vinho ou no copo de cerveja. Coma no pires, na cumbuca de sopa, simplesmente não coma em casa. Explique ao seu companheiro como limpar o cocô de seu bebê e como colocar a roupa na máquina de lavar. É mais simples que o usar o celular. Ele consegue.

Ser mulher é um privilégio e não um fardo. Todas as mulheres são especiais. Embora algumas tenham sido levadas a não acreditar nisso. Comecemos uma nova revolução, criando filhos e filhas para serem pessoas úteis, que dividam a vida e as tarefas. Apaguemos esse conceito pernicioso de que mulher é inferior e tem que servir, que o homem é um semideus, um herói ou príncipe encantado que liberta donzelas de torres e dragões. Aliás, em tempo, não criem suas filhas para serem princesas, belas, recatadas ou do lar. Criem para serem guerreiras, que saibam o que querem fazer de suas vidas e que saibam escolher companheiros ou companheiras que compartilhem das mesmas opiniões.

Vamos tornar esse mundo um pouco melhor, para nós mesmas e para as gerações futuras. Quem sabe um mundo com menos mais caciques e mais índios, menos comandantes e subalternos e mais pessoas partilhando as coisas do dia a dia, a convivência não seja mais fácil e a vida no planeta menos ameaçada ou ameaçadora?

Vamos proclamar discípulas, apóstolas, profetizas e sacerdotisas. Vamos construir um mundo onde nem exista mais igualdade de gênero, porque tudo vai se tornar um gênero só: o humano.

Obs: A autora é  jornalista, blogueira e Assessora de Comunicação.
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Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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