No mês de dezembro estamos bebendo o resto da água que caiu em fevereiro. Na casa de Dona Luzia, Manoel falou assim: São Pedro perdeu a chave do depósito da chuva! Dona Luzia não gostou: Nós é que perdemos a chave da oração!
Mas não faltou oração. O trabalho também não faltou. Caiu uma garoa em julho, e o lavrador pensou: Pode ser que seja o inverno que pede desculpas pelo atraso! – Todo mundo arou a terra com boi manso, plantou feijão e viu a planta nascente. Com duas semanas o sol abriu um sorriso largo: O inverno mandou dizer que não vem mais! – Sr. João que plantou três sacos, começou a dizer: Não vai se criar! Assim mesmo o feijão se punha de pé todo dia: Quero viver! – Quando chegava ao pino do meio dia, se entregava diante do sol e anoitecia fatigado. Mas no outro dia se levantava de novo com a mesma coragem. Assim ainda teve uns pés de feijão que encheram umas vagens nas terras ao pé da serra. Mas na caatinga tudo se perdeu. Sr. João falou: Nunca mais planto na frente de casa para o legume não morrer na minha vista!
A safra foi assim: Sr. Antonio que plantou seis sacos colheu os mesmos seis sacos. Na Serra do Exú teve gente que tirou vinte sacos. Irmão João colheu um saco e uma lata em duas tarefas. Sr. Lourenço plantou nove kg, colheu doze e entregou seis ao dono, pois a terra era de meia. O preço do feijão, de uma safra para outra, pulou de 4 Cr$ para 40 Cr$.
No Riacho do Maurício teve uma missa que por falta de local foi celebrada na sombra de um Imbuzeiro, situado numa roça de feijão. Irmão João perguntou ao dono: Sua roça deu alguma coisa? E o dono respondeu: Nada, a não ser pedra! Era no tempo que seria Ação de Graças pela safra. Como não tinha produção, pegamos nas pedras e fizemos procissão de penitência, arrodeando o campo. Sentimos na cabeça a dureza da vida, enquanto se cantava: Perdão, meu Jesus! – Por que esta roça não deu nada? A resposta fatal é: Por causa do pecado! – Sim, é verdade, mas é uns pecando e outros penando! Qual é o pecado? – É a falta de previsão: esta seca estava avisada pelos cientistas, e quem tinha o poder não tomou providência de nada. É a seca do Egito sem haver um José que construa armazéns para o povo escapar. A pedra na cabeça fazia sentir o peso que cai sobre os mais fracos. Quando chegamos no altar, todos jogaram as pedras num monte só, e aí ficou visível o tamanho da dor. O verdadeiro altar da missa foi este montão de pedras brutas: Será que elas um dia não serão transformadas em pedras preciosas para servirem de material no muro da Jerusalém celeste?
Obs: O autor é Frade Franciscano, nasceu na Alemanha em 1940.
Chegou ao Brasil como missionário em 1964. Depois de completar os estudos em Petrópolis atuou no Piaui e no Maranhão. Exerceu trabalhos pastorais nos anos 80 em meio a conflitos de terra. Desde 1995 vive em Teresina no RETIRO SÃO FRANCISCO onde orienta pessoas na busca da vida espiritual.
Foto enviada pelo autor.