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Depois de 50 anos, um artista plástico bem-sucedido retorna à sua antiga casa e a encontra em um estado de abandono, cercada por plantas e mato. Entre outras medidas, ele decide contratar um jardineiro para lhe ajudar na limpeza e organizar uma horta. Para sua surpresa, o novo jardineiro é um velho amigo de colégio que o artista não via há décadas. Aos poucos se desenvolve entre os dois uma amizade madura, permeada pelas diferentes experiências de vida de cada um. Na obra cinematográfica de Jean Becker “Conversas Com Meu Jardineiro” vamos, aos poucos, também descobrindo a riqueza de uma vida simples e questionando como temos a facilidade de complicar a nossa existência.

Não somente no gênero drama, mas desde os primeiros filmes dos gêneros terror e ficção científica, como “Metrópolis” ou “Frankenstein”, o cinema vem tematizando a relação do homem com sua criação, com a tecnologia. No filme “Exterminador do Futuro” desenvolve-se um verdadeiro duelo mortal entre máquinas e seres humanos. Na trilogia “Matrix”, o ser humano luta para se libertar do controle exercido por um sistema de computação altamente desenvolvido que vive da energia dos seres humanos e os domina através de uma realidade virtual. Deixando as visões apocalípticas e as narrativas fantasiosas de lado, encontramos nestas e em outras produções cinematográficas uma temática de extrema atualidade: a influência dos avanços tecnológicos em nosso cotidiano. Frutos da inteligência humana, os avanços da tecnologia vêm fazendo parte do dia-a-dia e, mesmo enfrentando as dificuldades e contradições de uma economia terceiro-mundista, grande parte da população acaba por usufruir de coisas como televisão, internet, celular, etc. Sem dúvida alguma, as inovações tecnológicas não podem ser vistas como ameaças à vida humana e muito menos como instrumentos do mal. Porém, o uso que fazemos delas é capaz de criar uma triste contradição: um sinal da inteligência de nossa espécie pode gerar a limitação da mesma. Semelhante ao que ocorre em relação às coisas naturais, o ser humano pode tornar-se dependente da tecnologia e esta, por sua vez, pode levá-lo a uma alienação de si próprio e de sua realidade. Diante da tecnologia, faz-se necessário, segundo Martin Heidegger, que o homem contemporâneo assuma uma postura denominada pelo filósofo de “serenidade diante das coisas”. Nós podemos dizer sim a todo o avanço tecnológico, lutar para uma socialização dos mesmos e, ao mesmo tempo, continuar a ser senhores de nossa vida possuindo sempre o poder de utilizar a tecla “desligar”. Nossa relação com os objetos que fazem parte de nosso universo será assegurada pela “serenidade” sempre que tivermos a consciência de que estes objetos estão a serviço do homem e não vice-versa. Em outras palavras, o ser humano poderá utilizar-se de toda a tecnologia e de todos os avanços da ciência e se manter livre de sua dependência, se tiver sempre preparado para viver sem eles. Diante do avanço da tecnologia que se torna cada vez maior é necessário entender que a sua utilização não pode ser critério de exclusão social, de dependência, diminuição da mobilidade física, rompimento do diálogo ou distanciamento de nossas relações sociais. Pelo contrário, a tecnologia está a serviço do ser humano para que este tenha mais tempo de saborear as diferentes dimensões da vida. Afinal, as inovações tecnológicas possuem sua razão de ser na criatividade e na vida do ser humano.

Ao lado da “serenidade diante das coisas” o mundo contemporâneo exige do ser humano a postura de “abertura para o desconhecido”. Os seres humanos movimentam o desenvolvimento das ciências e da tecnologia, mas não possuem conhecimento exato das conseqüências de suas inovações para o futuro. O mundo do conhecimento esconde sempre um verdadeiro mistério. Este, porém, não deve inibir as iniciativas para novas descobertas e melhoria da qualidade de vida do ser humano.  A única maneira de descobrir os limites do possível é ir além deles para o impossível. A “serenidade diante das coisas” e a “abertura para o desconhecido” devem ser posturas que caracterizam o ser humano de nossa contemporaneidade. Elas nos trazem a possibilidade de avançarmos em direção ao novo e, ao mesmo tempo, conservarmos o que é bom em nosso universo. O grande perigo para o ser humano não se encontra nas possíveis consequências dos avanços tecnológicos. O único perigo que desafia o ser humano no século 21 se constitui na alienação de sua realidade e de sua condição humana. A terrível ameaça para a espécie humana está na perda de uma prática saudável e que deve ser sempre desenvolvida: o pensamento. Corremos o risco de deixar de pensar, raciocinar e questionar criticamente diante da comodidade que os avanços da tecnologia podem nos oferecer. “O pensar deveria ser ensinado como se ensina a dança, como um tipo de dança” (Nietzsche).

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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