Padre Beto 1 de novembro de 2016

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Duas pessoas procuram a qualquer custo arrumar um casamento para o tímido professor Nello. Um deles é seu pai, um mulherengo conhecido em Roma que trabalha como alfaiate para o Papa e desespera-se com a personalidade do filho, pois quer um herdeiro para o ofício de vestir Sua Santidade. O outro é seu companheiro de quarto em Bolonha, o barbeiro Domenico. Este, um perfeito conquistador, não mede esforços para que o amigo encontre uma esposa. Nello a encontra, mas não em um lugar comum. Ele se apaixona por Ângela, uma das mais belas e liberadas mulheres de Bolonha, mas que havia sofrido um acidente que a deixou cega e à margem da sociedade. Mesmo sabendo da desaprovação de todos, Nello mergulha neste relacionamento descobrindo a essência do amor sem restrições. “Um Coração Para Sonhar”, de Pupi Avati, além de uma perfeita produção cinematográfica é uma reflexão sobre o sentimento de amor e as expectativas sociais existentes sobre ele.

Para Erich Fromm existem dois tipos fundamentais de amor que devem estar presentes no desenvolvimento de todo o ser humano: o amor paterno e o amor materno. Quando Fromm se refere a estes dois tipos de amor não está necessariamente falando do amor do pai e da mãe, mas sim de expressões de amor que as pessoas podem por qualquer pessoa humana. Em outras palavras, o homem pode demonstrar um amor materno e a mulher um amor paterno, apesar de o inverso ser o caminho mais comum. O amor paterno é o amor condicional. Através dele é transmitida inconscientemente a idéia de que somos amados porque cumprimos o nosso dever, porque somos como deseja a pessoa que nos ama. O amor paterno vem acompanhado de exigências que fazem com que determinados critérios de comportamento sejam absorvidos. Por sua vez, o amor materno é incondicional. O ser humano se sente amado simplesmente porque ele é. Esta experiência de ser amado maternalmente é passiva. Nós não precisamos fazer nada para conquistar este amor. Tudo que temos de fazer é sermos autênticos. O amor materno é cego, pacífico, não precisa ser adquirido, não necessita ser merecido. O filho pode ser um assassino, mas a mãe (ou o pai) continua maternalmente a amá-lo. Ao contrário do amor paterno, o amor materno não pode ser conquistado, nada podemos fazer para criá-lo. Para as crianças até uma determinada idade o problema é quase exclusivamente o de ser amado, amado pelo que se é. Depois desta fase ela começa a dar amor, a ter gosto de criar e expressar amor. Portanto, o amor materno é fundamental nos primeiros anos de vida de um ser humano. Somente com o amor incondicional, o amor materno, o ser humano poderá mais tarde compreender o amor paterno e este pode ser por ele correspondido. O amor materno tem a função de fazer do ser humano alguém seguro na vida. Ele é a base para uma constante auto-estima, a plataforma necessária para que possamos sempre nos sentir pessoas amadas.

Por ser incondicional, o amor materno é o incentivo para que o outro seja e se desenvolva da sua forma de se desenvolver. Em outras palavras, o verdadeiro amor materno é aquele que não impede o ser humano de crescer, não reforça e muito menos premia o desamparo. O amor materno tem fé na vida, não ficando, portanto, excessivamente ansioso e, assim, não contagiando o amado com sua preocupação em relação ao futuro e ao mundo. A mãe que possui um verdadeiro amor materno tem o desejo de que o filho se torne independente e acabe por separar-se dela.

Através do amor materno, o amor incondicional, o ser humano chega amadurecido ao ponto em que se torna seu próprio pai e sua própria mãe. Tem, por assim dizer, uma consciência materna e paterna. A consciência materna nos transmite a sensação de que não há ação ruim que nos possa privar de nosso amor-próprio, de nosso desejo de vida e de felicidade. A consciência paterna, ao mesmo tempo, aperfeiçoa o nosso senso crítico e não nos deixa aceitar nossas ações ruins, nos impulsiona para a mudança de conduta que possibilita nos tornarmos e sentirmos melhores. A pessoa amadurece no amor a partir do momento que possui as duas consciências e é capaz de amar maternalmente e paternalmente, ou seja, ela própria é a síntese dos dois amores. Enquanto o amor infantil possui como princípio “amo porque sou amado”, o amor amadurecido segue o princípio “sou amado porque amo”. O amor imaturo se exprime aos outros: “amo você porque necessito da sua presença”. Já o amor maduro deixa claro: “necessito da sua presença porque amo você”. A pessoa amadurecida ama tanto com a consciência materna quanto com a paterna, apesar do fato de as mesmas aparentemente se contradizerem. Se quisesse reter apenas a consciência paterna, o ser humano se tornaria áspero e pragmático. Se quisesse apenas reter a consciência materna, o ser humano estaria em condições de perder a capacidade de julgar e de impedir o seu desenvolvimento e o dos outros. De qualquer forma, o início de todo este aprendizado de vida e amadurecimento afetivo está no amor materno. Este é a base que nos faz alimentar o que há de mais divino em nós: a capacidade de amar.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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