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Meus queridos amigos

Quantas e quantas vezes tenho ímpetos de pedir a Nossa Senhora: mergulha Tuas mãos nas minhas fontes. Mãe, quando ias a fonte com o cântaro no ombro alguma vez te aconteceu encontrar água lodosa, água barrenta ou sempre te esperava água cantante e cristalina?

Ingenuidade minha, que água turva não se purifica na hora mesma em que nela mergulhas tuas mãos puríssimas?

Não é verdade que, em Canaã, pediste a teu Filho um milagre para que os noivos não ficassem sem vinho para os convidados? Imagino como pedes a teu Filho, quando o que falta, a milhares e milhares de filhos teus não é vinho: é água!

Quanta gente dorme mais acordada do que dormindo, para não perder a chamada avisando a chegada de água, à meia-noite, as três da manhã — e quantas vezes, depois de tanta espera, a água que chega é barrenta, dando até medo de beber…

Mãe, quanta, quanta gente mora em mocambo que nem merece o nome de casa! Quanta, quanta gente usa latas em lugar de panelas, de prato e de copo! Sem uma gota d’água para beber, nem para lavar as latas, nem para fazer de conta que se teve um arremedo do banho…

E se faltasse só água! É um crime deixar a criançada sem leite!

Tu sabes, Mãe, que é verdade: fome até três ou quatro anos deixa a criaturinha marcada, de cabeça fraca para o resto da vida!

Como a pobreza sofreu quando o charque sumiu para os pobres!

E o café que com um pedaço do pão era o jantar de tanta gente! E frutas! Somos um país de uma riqueza de frutas, que deixa os estrangeiros tontos, de água na boca… Mas até as frutas, pobre só pode ver exposta à venda na feira.

Quem parece água barrenta, lodosa é a política geral do nosso país…

Os projetos não só anunciados, mas em andamento, são projetos dignos dos faraós! São projetos de países super-ricos, superbilionários!

Mãe! Mergulha tuas mãos maternas nas águas da vida pública do nosso país! O Brasil te ama tanto! És do mundo inteiro, mas, de modo especial, és brasileira, brasileiríssima, de tal modo todos nós te amamos, minha Mãe, Nossa Senhora! (Quarta-feira, 25.11.1981)

Obs: crônica escrita por Dom Helder Camara, especialmente para o seu programa UM OLHAR SOBRE A CIDADE.
.Imagem e texto enviados pelo IDHEC – Instituto Dom Helder Camara

. Ver AUTORIZAÇÃO do IDHEC no item  OBRAS LITERÁRIAS.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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