Padre Beto 1 de outubro de 2016

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Aos seus 80 anos e doente, Fred se confronta finalmente com as limitações da idade. Porém, algo começa a mudar quando este senhor conhece uma nova vizinha, uma idosa extrovertida e sonhadora chamada Elsa. Com temperamentos opostos, Fred aprende com Elsa como a vida pode ser simples e, apesar das dificuldades que a idade impõe com o passar do tempo, ele ainda possui a possibilidade de viver novas experiências e saborear o que a existência lhe oferece. O belíssimo filme “Elsa e Fred – Um Amor de Paixão” de Marcos Carnevale nos leva à compreensão que a vida humana, em qualquer estágio, possui horizontes mais amplos do que podemos imaginar.

O ser humano, segundo Sartre, é o único ser que vivencia uma transformação como destruição. Uma rachadura geológica, uma tempestade, um maremoto não destroem, mas apenas modificam a distribuição das massas dos seres. O universo é simplesmente transformação. Se um terremoto pode trazer a morte de seres vivos, segundo a natureza, esta morte não será destruição, a menos que seja vivida como tal. Para haver destruição é necessária uma relação entre o ser humano e o universo e nos limites desta relação que o ser humano compreende um ser como destrutível. Isso acontece porque nós temos a tendência de delimitar as coisas, defini-las e de tentar mantê-las estáticas. O ser humano faz um recorte limitativo de si próprio e de todas as coisas em seu universo. Para ele um ser é isso e nada além disso. Portanto, a transformação de um ser significa para o homem destruição. Em outras palavras o “não-ser” surge sempre nos limites do universo humano. Todo ser humano possui uma idéia pré-concebida, um conceito formado de seus semelhantes e das coisas do mundo. Como também desejamos que tudo funcione em uma determinada organização. E justamente porque o ser humano espera a confirmação de sua hipótese, de seu conceito sobre as coisas, de sua visão sobre o funcionamento da ordem, que a natureza pode dizer-lhe: não! A negação aparece sempre sobre esta relação limitada entre o homem e o mundo, pois o mundo não revela seus “não-seres” a quem não os colocou previamente como possibilidades. Quem não possui a visão de que o universo é uma caixa de surpresas sempre é surpreendido com negações a seu mundo pré-concebido. Se espero um determinado comportamento de uma pessoa, deveria estar, ao mesmo tempo, preparado para a eventualidade de outro comportamento. Na verdade, compreender a possibilidade do ser e o não-ser de uma coisa ou acontecimento significa compreender a própria dinâmica da vida como algo essencialmente aberto. Para o homem um ser é frágil se traz em sua estrutura uma possibilidade definida de se destruir. Mais uma vez, o ser humano possui a idéia de fragilidade, porque ele constrói sobre este ser uma limitação individualizadora condicionando-a à fragilidade. Assim, nos acostumamos a dizer que uma determinada coisa é frágil e consideramos a maioria das outras sempre além de toda destruição possível. A relação de limite individualizadora que o homem mantém com um ser faz chegar a este a fragilidade e a possibilidade permanente de “não-ser-frágil”. É assim que o homem, por exemplo, considera um copo de cristal destrutível, precisamente porque o coloca como frágil, precioso e toma um conjunto de medidas de proteção quanto a ele. Ao mesmo tempo, este homem não percebe o quanto ele próprio é frágil e não toma as medidas necessárias para a sua própria proteção e qualidade de vida.

O que muitas vezes deixamos de compreender é a contínua transformação do universo e que a limitação das coisas, a sua individualização, depende sempre da direção de nossa atenção e dos nossos atos. A pobreza dos outros, o menino pedinte do farol, a administração pública, a atuação de nossos representantes no governo são nadificados quando não nos atinge diretamente. Só começamos a dar importância a todo o resto quando o alvo de nossos interesses é prejudicado ou já não existe mais. O segredo da vida está em uma percepção ampla, sem se fixar em nada, porque tudo se transforma. O segredo da vida é se interessar por tudo saboreando o todo, porque a vida não possui limites. Neste sentido, tudo está interligado nos obrigando a pensar no dinheiro que entregamos ao governo através dos impostos e nos benefícios que recebemos através da saúde pública, no pagamento dos professores da rede estadual ou municipal, em quem usufrui realmente da universidade pública, etc. Como também temos que vivenciar cada estágio da vida sem preconceitos ou visões pré-estabelecidas, pois como a juventude pode nos oferecer momentos desagradáveis, a velhice pode ser uma possibilidade de prazer e de transformar nossa existência em algo muito significativo.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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