A primeira pessoa que me abordou no sentido de concorrer a uma cadeira na Academia Sergipana de Letras foi Manoel Cabral Machado. Era assunto que já tinha debatido com José Amado Nascimento e Maria Thétis Nunes, que concordavam plenamente. Respondi-lhe, de chofre, em tom de brincadeira, que era muito novo para tanto, ao que Cabral replicou que não, que eu já estava com muito cabelo branco. Tive de falar sério e revelei que só pretendia ocupar a cadeira que tinha sido de Sebrão, sobrinho. Me veio a pergunta: e quem é o ocupante atual? Luiz Carlos Fontes de Alencar, respondi. Pois bem. Cabral fechou a conversa: esses Alencar não morrem, como a me dizer que não esperasse. Época da conversa: idos da década de oitenta do século passado.
Desse fato me lembrei no dia 02 de julho quando tive a notícia da morte de Alencar, ocorrida em Brasília. É verdade que não esperei o seu óbito e me candidatei em 2008 a uma vaga na Academia, justamente a deixada por Cabral Machado. Tive o voto de José Amado e de Thétis, que se foi antes de minha posse. O falecimento de Alencar desencadeia a sua sucessão. O rei está morto e novos príncipes se habilitam a ser o novo rei. Cabral não estava certo. A morte, em menos de dois meses, ceifou a vida de dois Alencar – Hunaldinho e Alencar -, começando pelo primeiro, que era o mais novo da família, como a reiterar que o irmão mais velho não tem a obrigação de morrer primeiro. A gente é que não entende a lógica da morte.
A Academia é um pouco de morte e de sucessão. A imortalidade se resume em ser lembrado no discurso de posse. Imortalidade de papel sem o reconhecimento de firma de cartório. Talvez ninguém, na platéia, preste atenção ao discurso, e aí a imortalidade vira mortalidade. Quando entrei na Academia, não prestei atenção a escuridão que escondia a morte, que continua na sua calçada, a espera de um e de outro, escolhendo, com seus dedos esquálidos, quem é o acadêmico da vez.
Não há como dissociar a Academia da morte. Daí a pergunta: depois de Alencar, quem será o próximo? A morte há de responder que, de antemão, só ela sabe. O acadêmico, contudo, só tem conhecimento quando a notícia chega, e aliás, se não for ele o escolhido. Dá um certo medo de ser acadêmico. Mas, ninguém renuncia a cadeira e a disputa, para seu ingresso, é quase sempre disputada, porque, a esta altura, ninguém vê a morte na escuridão: é a disputa não permite.
Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.