denis ninguem muda ninguem

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Nunca vi coisa melhor para nos ensinar sobre a fragilidade e impotência que temos perante a vida: A tentativa de mudar alguém.

Não existe regra, mas na maioria das vezes nos esforçamos para mudar e tentar melhorar a vida das pessoas pelas quais nutrimos um mínimo de afeto. Se estamos fazendo da forma errada ou não já é uma outra questão. Poderíamos abandonar a pessoa na primeira tentativa (assim como fazemos com quem não gostamos), mas não conseguimos. Procuramos as mais diversas alternativas. Apelamos para Deus, para psicólogos, médicos, familiares e até para o cachorro, caso ele aparente ter uma solução para resolver o problema.

E a cada tentativa, uma frustração nova. Novamente digo: Nós nos frustramos pois existe afeto envolvido. Você pode estar pensando que não acredito na mudança do ser humano. Acredito sim. Primeiramente numa mudança individual, no tempo dele, isto se ele enxergar e quiser mudar. Pessoas são influenciadas todos os dias para serem o que o “sistema” quer que elas sejam, inclusive se realizam nessa tarefa, mas, no fim das contas, a escolha passa pelo indivíduo, seja ela inconsciente ou não.

O sofrimento que sentimos por ver alguém cavando o seu próprio buraco sem poder resgatá-lo é muito difícil. Ninguém gosta de se sentir impotente. Não raramente as pessoas mais próximas de nós são as que menos nos ouvem. Acho que é daí que nasceu o dito popular “Santo de casa não faz milagre”. Então, decidimos desistir, mas ao mesmo tempo não desejamos que desistam da gente. É muito doloroso quando não há mais expectativa por parte do outro de que podemos mudar para melhor.

Mas existe um outro lado, muitas vezes obscuro, que nos esquecemos de pensar. Queremos que o outro seja aquilo que está no nosso imaginário ideal. Atropelamos o outro com a nossa vontade narcísica, nos esquecendo que ele também tem vontade e vida própria, inclusive para se enterrar sozinho, se assim desejar.

A psicanalista Melanie Klein criou um conceito que ela chamou de reparação maníaca. A grosso modo, esse tipo de reparação significa que tentamos consertar algumas coisas dentro da gente e no outro, não necessariamente por amor genuíno ou altruísmo, mas por um forte sentimento de culpa. Por estarmos “devendo no cartório”, tentamos consertar outras tantas coisas por aí. É claro que nem toda reparação é maníaca, mas na maioria das vezes não percebemos, por isso mesmo que a terapia pessoal ajuda e muito a entender o porquê fazemos e como fazemos essas reparações.

Se por um lado temos que respeitar os limites e o tempo do outro, também temos que entender o nosso. Você também pode (se assim desejar), se afastar física ou emocionalmente de quem lhe faz mal ou nunca muda, se essa falta de mudança te machuca e consome toda a sua energia. Às vezes, o tempo de mudança do outro não se encontra com o tempo da nossa mudança. Por isso presenciamos e sentimos os (des)encontros e os (des)ajustes da vida. As separações conjugais, os desentendimentos familiares e os términos de amizades também nascem dessa mesma fonte.

Podemos, sim, ser ambiente e espaço de influência e mudança de alguém. Mas a mudança em si, não está em nossas mãos. Ninguém muda ninguém.

Se puder, caminhe para ajudar quem você gosta, até onde seu corpo suportar. Porém, se caminhar demais e ultrapassar seus limites, seus pés se encherão de bolhas e você não conseguirá nem colocar os seus sapatos, tampouco carregar o próprio corpo.

Obs: O autor é Psicólogo, palestrante, terapeuta de família casal. 
Imagem enviada pelo autor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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