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Você, eu, a gente queria falar de outra coisa. Você sabe, eu sei. Mas terminamos falando sempre mais do mesmo.
Queríamos falar da beleza sem medida desse País continental. Mas a feiúra das nossas cidades, das nossas praças e parques, e das nossas estradas não deixam.
Falar da riqueza desse Brasil, ainda potro em relação à velha Europa. Mas as pobrezas neoanalfabetas intelectual, material e funcional do nosso povo nos queda sempre a fala e o ato.
Queríamos falar dessa rica e multicolorida flora tupiniquim. Vergada, mas ainda imponente apesar dos campos concentrados de soja a perder de vista e a turvar nossas retinas, fatigadas de tanto nada. Desertos que prenunciam tornados e furacões. Quem há de domá-los? Quem há de sobrevivê-los? Nós, os filhos da agrodependência?
Falar dessa exuberante e polimorfa fauna. Já exangue pelas matanças seriadas e brutais de nossos ditos animais. Enquanto o ‘bom selvagem’ em nós domesticou o medo e continua espalhando o terror entre os nossos pobres bichinhos restantes e até entre nosotros, ditos humanos, quiçá entre os sobreviventes guerreiros indígenas.
Dessa única e belíssima cornucópia sonora da musica brasileira. Que até espanto e ameaça representou para os norte-americanos. Mas o lixo alienado e alienante dos hits da hora – forjados a cada tlim-tlim – nos ensurdecem a alma e achatam o nosso senso de ridículo. Argumentar sobre e escutar a si, quem há de? Quando o reino da onomatopéia grassa.
Das belezas naturais dos lugares parasidíacos Brasil adentro, que nunca preenchem a iris da maioria da população. E simplesmente porque essa geralmente não tem sequer os dois metros de latifúndio que lhes cabe na hora derradeira. Quem sabe a sua interior e necessária transfiguração do eu, necessitada de lonjuras e livramentos, refletidas nas palavras seculares de Pessoa que já nos dizia: “a nossa única riqueza é ver”.
Desse rico e variado continente de terra e de águas doces e salgadas, de clima tropical equatorial semi-árido predominante, mas cujo povo em grande parte já está acima do peso normal. Empaturrado que está de fast food e hormônios do capital ensandecido do globalizante e agressivo agronegócio. (Desconfio que foi o Tio Sam que nos empurrou o biotônico Fontoura, aquele remédio do peixe, para que gerações não gostassem de carne branca, porque esta, bíblica e dadivosa, não gera o agrocapital).
Queríamos falar de sonhos, de promessas, de possibilidades, de tudo o que poderia vir-a-ser. Mas terminamos enredados nesse labirinto da fera: o minotauro do agora, carcomido e fugaz, porque não teve o seu alimento no passado e sua fome agora é de séculos.
Porque aqui, no final das contas, tudo continua novo e velho, belo e feio, moderno e atrasado. Um mais do mesmo com gosto de século dezenove e, sim, ainda totalmente barroco. E o que nos resta é abafar esse lancinante grito que trazemos na alma e tentar controlar esse choro amiúde, convulsivo e rouco.
Afinal, onde o belo e o feio se excedem, o expectador, partido em excessos, não tem como possuir nenhum senso de pertencimento. Eis-nos: brasilianos desterrados, desde ontem, desde sempre.
Obs: Imagem enviada pelo autor.