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Urge uma lei, lei mesmo, no duro, que proíba, terminantemente, o homem, na mesa de restaurante, no momento do almoço ou  jantar, discutir assuntos sérios, com os que estão na  mesa  vizinha. Ou a gente bebe e come, ou, faz opção  pelas discussões sérias que a temática carrancuda reclama. Não dá para beber, comer, ouvir e rebater ou concordar com matérias de grande magnitude, a exigir preparação prévia. É sair do norte para o sul abruptamente, sem excluir do cérebro a paisagem anteriormente vivida. Não dá e não se discute mais.

Há pouco um amigo viveu situação dessa e me revelou seu mal estar. Ao lado de dois colegas de profissão,  num conhecido restaurante, teve o desprazer de despertar atenção do vizinho de mesa, no momento sozinho, – chegou primeiro que os companheiros de mesa – que queria conversar com alguém, e ele foi o escolhido.  Conversar, não, monólogo puro, exposição de suas idéias, de seu entendimentos acerca da civilização do Brasil desde as suas origens, na crítica a Rosseau, como a pessoa que mais prejudicou o mundo, evocando, em contrapartida, o nome de Kant, para aterrissar na grama jurídica, e dar a entender  que todo aquele discurso faz parte de um livro de direito, que está a produzir.

Ele queria conversar com os membros da mesa sobre assuntos corriqueiros, leves,  fofocas novas e similares outros, e o seu ilustre vizinho, na sua peroração, parecia estar numa sala de aula, a expelir conhecimentos jurídicos que, pela sua inconveniência, lhe doíam na mente. Na primeira oportunidade, depois de se limitar só a assentar com a cabeça em sinal de concordância com o que ouvia, desviou o rosto e entabulou conversa com os da sua mesa, sem virar mais a cara para o culto lindeiro.  Alguém sentou ao lado do erudito interlocutor, mais outro, a mesa foi aos poucos sendo povoada, e, bem, ufa, ufa, livrou-se daquele papo chato, pesado, desagradável e inoportuno, de conhecimentos que ninguém quer ouvir em mesa de restaurante.

Mesmo assim, saiu feliz do almoço. É que, no frigir dos ovos, pesando os prós, em nenhuma quantidade, e os contra, que máquina de calcular não aterrissa em nenhum número, pulou a fogueira. E aí me explicou: não foi convidado para escrever o prefácio.

Obs: Publicado no Diario de Pernambuco
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras. 

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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