lourenca coisas de lou 34

A barriga da mãe crescia e ela sumia cada vez mais da nossa vida. Seu quarto vivia na penumbra. Vez ou outra vinha um médico. Quase sempre, enfermeiras. A casa cheirava a remédio e tristeza. Um dia ela se foi. Veio a tia e abriu todas as janelas. Pôs flores nos vasos, coloriu as camas e a casa ganhou cheiro de alfazema. Nada disso mudou nossa vida. Continuava doendo nos quatro aquela despedida que não entendíamos. Fomos ficando solitários. E rebeldes. A tia foi ficando amarga. E impaciente. Um dia ela ficou histérica. Gritou, xingou, exagerou. Prendeu as mãos da caçula nos pés da mesa. Nós nos encolhemos em volta dela. Ficamos ali chorando baixinho. Ficamos ali até a chegada do pai. Nunca mais vimos a tia. Virei a mãe da família.

Obs: Imagem enviada  pela autora  (Arte: Zinaida Evgenievna Serebriakova)

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


busca
autores

Autores

biblioteca

Biblioteca

Entrelaços do Coração é uma revista online e sem fins lucrativos compartilhada por diversos autores. Neste espaço, você encontra várias vertentes da literatura: atualidades, crônicas, reportagens, contos, poesias, fotografias, entre outros. Não há linha específica a ser seguida, pois acreditamos que a unidade do SER é buscada na multiplicidade de ideias, sonhos, projetos. Cada autor assume inteira responsabilidade sobre o conteúdo, não representando necessariamente a linha editorial dos demais.
Poemas Silenciosos

Flickr do (Entre)laços
[slickr-flickr type=slideshow]