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Estamos outra vez em ano político-eleitoral, diante do que se verificam as mais diversas reações e comportamentos. Muitos não escondem a decepção sobre o assunto e afirmam ter nojo da política e dos políticos. Outros se mostram indiferentes e apáticos ao que transita nesse campo, julgando inclusive que o tema não lhes diz respeito ou não interfere em sua vida. Há ainda quem considere o voto apenas como mais um entre tantos outros deveres que o cidadão precisa cumprir. Mas, no conjunto do eleitorado também estão os que compreendem o ato de votar como um importante direito. Esses podem ser subdivididos em dois grupos: os que concebem o voto como algo que se esgota em si e os que o veem como um mecanismo democrático com exigências para além dele mesmo.

Em cada eleição e, sobremaneira na próxima, há necessidade de análise crítica da trajetória e do projeto dos candidatos, bem como da conjuntura política e econômica local, regional e nacional.  Importa igualmente considerar os condicionantes externos, tanto em nível latino-americano quanto global. Embora tais condicionantes não determinem o futuro, eles sempre estabelecem limites e possibilidades. Além disso, existem os fatores estruturais que impactam a vida econômica e política do país independente de quem esteja no governo. Nesse sentido, vale pontuar, por exemplo, a recessão do sistema capitalista mundial, o implica uma situação mais difícil na balança comercial e no orçamento público.

A crise, porém, não se restringe à economia. Os protestos em massa em âmbito internacional, que se acentuaram no último ano sob as mais diversas bandeiras e orientações, constituem um quadro de instabilidade política. Associado a isso, no Brasil verifica-se outro elemento que traz novas demandas ao Estado, que é a emergência de uma nova classe média. Logo, o aumento do salário mínimo (segundo o Dieese, nos governos Lula e Dilma houve um aumento real de 72%), os avanços na área da educação, na geração de empregos e em diversas outras políticas sociais, se mostram insuficientes. As conquistas sempre trazem consigo outras demandas. Ademais, mesmo que o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) nacional esteja melhorando, a desigualdade social ainda é enorme.  Segundo pesquisa recente do IBGE, os 10% mais ricos da população brasileira detêm 44,5% do total da riqueza produzida enquanto os 10% mais pobres recebem apenas 1,1% de tudo que é produzido.

Analisando os dois candidatos à presidência da República com maior intenção de voto, o sociólogo Felipe Filomeno afirma que com Dilma, “podemos esperar a continuidade de uma estratégia “terceiro-mundista”, não tão assertiva quanto a de Lula, mas também alicerçada no multilateralismo, no BRICS, na UNASUL e no MERCOSUL. De uma presidência de Aécio, podemos esperar um internacionalismo liberal menos pautado pela clivagem Norte-Sul. Isto é arriscado, no sentido de que hoje vivemos um momento excepcional de instabilidade na hierarquia centro-periferia que historicamente caracteriza o sistema mundial, uma oportunidade que pode ser desperdiçada num abandono de iniciativas “terceiro-mundistas” contestadoras desta hierarquia” (In:  http://outraspalavras.net/brasil/a-politica-externa-dos-presidenciaveis/). Desse modo, o projeto político de Dilma tende a aprofundar a integração regional em uma perspectiva anti-imperialista e contra-hegemônica, ao passo que o projeto de Aécio enfatiza um alinhamento com o Atlântico Norte, sobretudo com os EUA em uma perspectiva mais neoliberal.

Nota-se, portanto, a complexidade das implicações do voto. Ele não é um mecanismo mágico que, uma vez acertado o seu alvo, resolve todos os problemas. Por isso, não basta votar, elegendo esse ou aquele. Ao mesmo tempo em que existe o desafio de romper com uma série de barreiras que dificultam realizar a melhor eleição possível, é necessário prosseguir a luta pela consolidação de profundas reformas na área política, tributária, fiscal, agrária, urbana, do judiciário, etc. Emendar esforços na construção de um projeto nacional com justiça social e econômica. É com vistas a garantir reformas estruturais no sistema político, que será realizado nesse ano, na semana da pátria, o plebiscito popular por uma constituinte exclusiva e soberana do sistema político. O resultado do plebiscito poderá pressionar o Congresso Nacional a convocar uma constituinte exclusiva para produzir reformas estruturais capazes de superar uma série de graves distorções existentes no atual modelo.

Em se tratando de eleição, é oportuno ressaltar uma vez mais que o voto não tem preço, mas tem consequências; é secreto, mas não tem mistérios; é obrigatório, mas não pode ser um simples dever; é um direito de grande significado, porém não é suficiente votar. É preciso estudar e discutir as questões conjunturais e estruturais mais amplas. Além disso, fazer valer os instrumentos já conquistados pela iniciativa popular como a Lei 9.840/1999, que combate a compra de votos e o uso da máquina administrativa para fins eleitoreiros; e a Lei Complementar da Ficha Limpa 135/2010 que impede candidatos condenados pela Justiça concorrerem a cargos eletivos. Se o voto é mais que um direito, a qualificação da democracia é mais que um dever de alguns. É compromisso de todos!(10.2015)

Obs: O autor é Doutor em Sociologia, pós-doutor em Educação e professor da Universidade Federal do Sul da Bahia.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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