Maurício Cavalheiro 1 de fevereiro de 2016

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Os passos pressurosos eram para abreviar o tempo de retorno ao lar. A expectativa em revelar a sua nova aquisição, não desfazia aquele sorriso no rosto. Os transeuntes, curiosos, olhavam-no segurando uma enorme embalagem, cuja proteção plástica, impedia desvendar o seu conteúdo.
Abriu o portão, gritando:
– Benhê! Jonzinho! Nininha!
Os filhos, que brincavam no balanço, correram ao encontro do pai.
– O pai chegou, mãe!
A esposa abriu a porta enxugando as mãos no avental.
– Que gritaria é essa???
– Tenho uma surpresa para vocês. Tenho certeza que irão gostar.
A esposa e os filhos, seguiram-no até o quintal. Ele ordenou-lhes que se sentassem. Depositou o pacote no chão e, segurando a embalagem, puxou-a ligeiramente. Quis semelhar-se com um mágico.
– Tcham! Tcham! Tcham! Tcham! Gostaram?
O filho de três anos, espremeu os olhinhos e questionou:
– Por que o senhor comprou uma galinha, pai?
– Não é uma galinha, filho – disse a mãe com ternura – é um louro.
– Mas ele é verde, mãe… Louro não é amarelo? Indagou a filha.
– É um papagaio – definiu o pai – Pretendo ganhar muito dinheiro com ele. Vou ensiná-lo a falar, a cantar o Hino Nacional… Todos os programas de televisão vão querer entrevistá-lo… Aí eu peço uma grana preta… Vamos ficar ricos! Agora preciso escolher um lugar para ele ficar…
– Que tal ali? Sugeriu a esposa.
Suspenderam a gaiola do bípede emplumado sob o telhado da área de serviço. Naquele mesmo dia, o marido repetiu algumas palavras para a ave, que permaneceu alheia aos ensinamentos.
Meses se passaram e, mesmo com a insistência daquela doutrina, o animal não evoluía. Raramente ouvia-se um curupaco.
– Talvez eu não seja um bom professor! Confidenciou certa vez a um amigo.
– Não é nada disso… já li uma reportagem sobre adestramento de animais… Pra ensinar um bichinho, é necessário que ele receba muito carinho e compreensão.
Naquele dia, o marido voltou decidido a acariciar o papagaio. Certamente o seu amigo estava com a razão. Quem não gosta de um carinho?
– Loro! Curupaco! Começou a falar, abrindo a portinha da gaiola para fazer um cafuné no cocuruto do papagaio. Diga: CO-MI-DA! CO-MI-DA!
O papagaio olhou desconfiado e abriu o bico. “Ele vai falar”, pensou. Quando a mão aproximava-se da ave, esta mordeu-lhe o indicador, que só foi liberado depois de um palavrão gritado.
No outro dia, com o dedo enfaixado, encontrou-se novamente com o amigo.
– E aí? Conseguiu fazer o bicho falar?
– Que nada! – Respondeu constrangido – Além de não dizer nenhuma palavra, ainda me fere o dedo.
– Você já reparou que os animais quando obedecem ao dono, recebem alimento? Por que você não faz o mesmo?
– Mas ele não me obedece.
– Então não lhe dê comida até que ele faça o que você quer.
Resoluto, confiou mais uma vez no amigo.
– Loro! Curupaco! Ou você fala alguma coisa ou não lhe dou comida. Entendeu?
O papagaio continuou indiferente diante da ameaça. Entretanto, a partir daquele dia ficou terminantemente proibido a alimentação do animal.
– Quem se atrever a dar comida pro papagaio, vai se ver comigo. ENTENDERAM?
Ninguém se atreveria a contrariar a determinação daquele homem severo, capitão reformado do exército.
Naquela semana o papagaio não foi alimentado.
Certo dia, a mulher varrendo o chão, ouviu uma voz esganiçada e debilitada:
– Co… mi… da!
Olhou para todos os lados mas não havia ninguém. Seus filhos estavam na escola.
– Co… mi… da!
Surpreendeu-se quando percebeu que o papagaio finalmente falava. Jogou a vassoura e correu ao telefone.
– Querido! O papagaio tá falando! Venha depressa!
Estupefata, tanto quanto como quando ouvira a primeira palavra pronunciada por um filho seu, retornou para próximo da gaiola.
– Co… mi… da… Co… mi… da…
O marido entrou correndo e ainda conseguiu ouvir a ave dizer:
– Co… mi… da…
– Traga as sementes de girassol, mulher… Traga o girassol – berrou.
A mulher obedeceu. Porém, quando entregou o pacotinho ainda lacrado ao marido, ouviu o papagaio repetir a palavra e tombar na gaiola.
Era muito tarde. O papagaio havia morrido de fome e destruído o sonho do marido em se tornar milionário.

Obs: Maurício Cavalheiro, membro da Academia Pindamonhagabense de Letras é autor de: Lágrimas de Amor – poesia; O sapinho jogador de futebol – infantil; O estuprador de velhinhas & outros casos – contos; Histórias de uma índia puri – infanto-juvenil; O casamento do Conde Fá com a Princesa do Norte, e Um caso de amor na Parada Vovó Laurinda – cordéis.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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