
Comprei um livro de poemas
de um grande poeta pátrio.
23 reais. Foi razoável.
A edição é bem cuidada,
a qualidade, sem retoques.
Não foi de graça: nem todos,
em nosso pobre país, dispõem
de tal quantia para pagar poesia.
É fato que não foi caro. Não foram
os 39 que pretendia o livreiro.
23, retruquei eu. Amparavam-me
o código do consumidor
e salvadora etiqueta
no livro esquecida um dia.
A moça do caixa não soube o que fazer:
consultou outra moça, que consultou
alguém numa sala alta.
Temi o apelo emocional:
“eu é que terei de pagar a diferença”.
Preparei retórica, alegação de absurdo,
menção à dignidade oculta do patrão
ou à necessária interferência do sindicato dos comerciários.
Nada disso foi preciso. Voltou sorridente
a segunda moça: “pode registrar”.
23, disse à do caixa.
E leio, com bom proveito, o livro
do grande poeta pátrio.
Achando que, a bons preços,
muitos mais também leriam.
Obs: Texto retirado do livro do autor – É Lenta a Palavra Tempo –