Encerrado o ano letivo, iniciavam-se as férias escolares. Itabaiana ganhava uma nova feição. Recebia uma animada população de estudantes, procedentes de diversas Universidades e do Colégio Atheneu Sergipense. Jovens se juntavam nas ruas e ocupavam o coreto e os bancos da praça da Matriz, os degraus da varanda da Associação Atlética, as mesas do Bar Brasília e os salões da casa de seu Jubal para jogar botão. Éramos todos amigos e bons estudantes. Alegria, ideias, sonhos e solidariedade emanavam de cada um de nós.
As festas mais destacadas do calendário eram comemoradas dentro do período de nossas férias. A população da cidade aglomerava-se na praça de Santa Cruz, transformada em parque, para festejar Natal, Ano-bom e Reis. O significado histórico, religioso e afetivo de cada uma delas não irradiava, entre nós estudantes, a mesma grandeza e luminosidade enraizada em nossos pais e avós.
Na noite de Natal, nós não comemorávamos com significativa crença e emoção o nascimento de Cristo, o filho de Deus. Ele teria vindo ao mundo para nos salvar, entretanto havia permanecido indiferente à cólera, à peste, à matança dos índios e judeus, à escravidão dos negros e à fome na África. Não se entende a existência de um Deus dotado de todos os poderes, mas desprovido de um sentido humanitário palpável. Carinho e conforto recebemos da convivência com os amigos. Alívio da dor e cura das doenças chegam apenas com a evolução dos conhecimentos.
No dia de Ano-bom, o clima de confraternização em nosso ambiente era intenso. Festividade permanente, não ficava restrita somente ao primeiro de janeiro, apenas mais evidente. Nossa solidariedade foi estimulada por um hino, uma bandeira e marcos geográficos, a ocupar apenas nosso território, tornando a confraternização universal, sentimento regional. Faziam parte da cultura local, na véspera e no Ano-bom, vestir branco, pagar as dívidas, dar esmolas e desejar o bem a quem tenha nos ofendido em algum momento.
Na festa de Reis, nenhum estudante colhia da memória informações sobre a lenda dos três reis magos que, guiados por uma estrela cadente, foram até o estábulo para conhecer de perto e presentear o recém-nascido menino Jesus. Levaram ouro, que representava nobreza; incenso que representava a fé; e mirra, que representava sacrifício. Nos dias de festa, os mais idosos escolhiam ir à missa e visitar os diversos presépios, montados e divulgados com orgulho por algumas famílias da cidade. Já os mais jovens preferiam as conversas, os passeios, o balanço de Carrasco, o tivoli de Miguel Fagundes, a onda de Zeca do Vinagre, a torcida pelos números da roleta, ganhar um olhar, um abraço esperado, dançar apertado e admirar as curvas afrodisíacas das mocinhas formosas.
Obs: O autor é médico e membro da Academia Itabaianense de Letras.