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Desde os tempos mais antigos, a humanidade vive experiências de dominação pelo poder e pela força. Embora haja fatores específicos que explicam a emergência de cada império, alguns elementos parecem comuns. Entre eles, o incontido desejo humano de superioridade e a busca deliberada de subjugação social, cultural e econômica. Com diferentes nomes, características e impactos, tal fenômeno atravessa a história, estabelecendo relações conflitivas entre grupos, sociedades, povos e nações. A marca forte desses processos é o desrespeito à identidade e à dignidade do outro.

O conceito comum (imperialismo) adotado para referir tais práticas é altamente auto-explicativo. Na vida sociopolítica, imperar significa, na maioria das vezes, impor-se por força das armas, do dinheiro e da cultura. De acordo com o intelectual palestino-americano Edward Said, “todo império diz a si e ao mundo que ele é diferente de todos os outros” (In: ATKINSON, Sam et al.. O Livro da Filosofia. São Paulo: Globo, 2011, p. 321). E, por ter-se como tal, não considera os outros dotados de valores e merecedores de respeito, mas os vê e os trata como potenciais concorrentes que devem ser controlados e combatidos.

Na história, impérios, imperadores, recursos e métodos típicos se sucederam e coexistiram, alimentando o ideal de que o melhor e o mais importante é quem tem mais capacidade de dominar. Assim, pelos tempos afora, foram produzidos rastros incontáveis de luta e sofrimento. Por sua própria natureza, os impérios “saqueiam” o poder e mascaram os abusos que fazem dele. Reproduzem e atualizam práticas colonialistas; controlam a economia; forjam ações totalitárias; imprimem preconceitos e discriminação de toda ordem e instituem fluxos contínuos de imposição cultural.

Em sua obra Cultura e Imperialismo (1993), Edward Said analisa como a questão cultural se constitui em um campo propício para a reprodução do espírito de dominação. Ele confirma a ideia de que o imperialismo não se tornou algo do passado, superado com o desmantelamento dos impérios clássicos. Na verdade, embora o mundo tenha avançado muito no conhecimento, na tecnologia e nas formas democráticas de organização, o imperialismo continua a ser um traço marcante nas relações internacionais e globais.

Os impérios acabam sempre por se constituir em pólos difusores de suas concepções políticas, de suas estruturas econômicas e de suas orientações ideológicas. Normalmente buscam legitimação através da cultura e da religião. Em cada fase do capitalismo, os imperialismos assumiram configurações próprias. Surgido no final do séc. XIV, o capitalismo mercantil caracterizou-se por grandes navegações associadas às relações de exploração comercial das colônias pela metrópole. No capitalismo industrial, implantado a partir da segunda metade do séc. XVIII, os impérios se afirmaram na exploração de recursos naturais e humanos com a utilização dos emergentes recursos tecnológicos.

A partir do séc. XIX houve um novo movimento colonial caracterizado, entre outros fatores, pela avidez das potências industriais europeias em dominar novos territórios, assegurar o controle de matérias-primas e energia e explorar novos mercados. Com isso, foram instigados os nacionalismos e as políticas imperialistas, o que acabou produzindo duas guerras mundiais no século XX. Com o avanço da globalização capitalista, o livre mercado passou a se constituir na figura central do novo imperialismo. Para Octavio Ianni, “o globalismo pode conter vários imperialismos, assim como diferentes regionalismos, muitos nacionalismos e uma infinidade de localismos. Trata-se de uma totalidade mais ampla e abrangente, tanto histórica como logicamente”.

A emergência de impérios pós-modernos, ao mesmo tempo em que mantém tradicionais traços de dominação, inovam em sua forma, buscando a construção de um novo paradigma estrutural baseado no declínio do Estado-Nação, na desregulamentação dos mercados e nas ações de alcance global. O atual formato imperial – o capitalismo globalizado – integra os diversos poderes que o constitui e os articula em rede. Busca, assim, superar clássicas fronteiras sociais, políticas e territoriais para se consolidar de um modo distinto, isto é, como poder onipresente, sem centro nem território demarcado.

Para Michael Hardt e Antonio Negri, no livro O Império (Ed. Record, 2001), o império pós-moderno baseia-se em três meios de atuação global: o aparato militar (em especial, o arsenal nuclear); os mecanismos monetários e o mercado mundial sob o controle dos centros financeiros imperiais, chamados também de cidades globais; o sistema educacional e a produção cultural. As novas formas de colonialismo das mentes, dos corpos e dos territórios misturam também boas doses de racismo, fundamentalismo e terrorismo. Portanto, parece claro que, com o passar do tempo, os impérios não se enfraquecem. Antes, sim, se aprimoram.(01.02.2013)

Obs: O autor é Doutor em Sociologia, pós-doutor em Educação e professor da Universidade Federal do Sul da Bahia.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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