
O solfejar que aprendi era muito rudimentar. Senti uma vez quando me deparei com um professor de música e ele ficou impressionado. Eu não solfejava. Em verdade, dizia as notas, sem entonação alguma. Foi assim que aprendi, justifiquei. E assim toquei trompa e depois trompete. No soprar, o instrumento faria o som devido, de acordo com a pauta musical. O interessante de tudo é que, como tocávamos, quase que religiosamente, dobrados, terminei, depois, me apaixonando por esse tipo de música. Paixão braba, ressalte-se. Sem ter sido militar, talvez seja uma das poucas pessoas que se senta para ouvir um cd de dobrados. E ademais, o faço em estado de sobriedade. Nunca experimentei escutar ingerindo algumas taças de vinho. Temo que a emoção me derrube em lágrimas. Melhor evitar.
Lágrimas de saudades, evidentemente. Da banda, lá, na Itabaiana, as terça e as quintas, nos ensaios, até que um dia perdi o entusiasmo, porque, estudando em Aracaju, só nas férias podia comparecer. E uma vez, a embocadura falhou e o som não saiu. Passei vergonha. Antonio Melo me socorreu com seu sax. Senti que minha medíocre carreira de músico tinha encerrado. Mais um pouco, como o atleta velho, que cisma em continuar jogando, teria sido vaiado. Ficou o gosto pelo dobrado, em cd´s, a trazer alguns que toquei. Bem ou mal, mas toquei. Nos ensaios, no coreto da praça, nas procissões, em solenidades civis, etc. Não posso ver uma banda hoje para não parar a fim de apreciar melhor, feliz por distinguir o som de cada instrumento, de canto, de contracanto, de marcação. A música me influenciou, de modo que, quando me reúno com a assessoria, faço questão de invocar a banda para dar exemplo de como deve ser exposto um voto. Nada de trechos divorciados um do outro, como se fossem estranhos e estanques. Necessário de um para o outro uma frase qualquer,como, por sua vez, por seu turno, por outro lado, já, etc. e etc. E aí dou o exemplo da tuba, que, muitas vezes, entre uma parte e outra, torna seu som rouco em elo de ligação, num pom, pom, pom, que toma um espaço quando o canto não entra. E aí não tem jeito. O menino de quatorze anos volta à tona no homem de sessenta e cinco anos, mas … despojado do trompete.
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.
Obs: Publicado no Diario de Pernambuco.