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Cada um de nós vive imerso numa cultura, mesmo sem nos darmos conta disso. Ela nos proporciona valores, expectativas, visões do mundo, normas e orientações, enfim toda uma linguagem que ordena a realidade confusa e orienta nossas opções. É ela que nos faz realmente seres humanos, que possibilita nossa convivência, que nos capacita a enfrentarmos os desafios da vida. Enfim é ela que proporciona nossa identidade social. Nosso dia a dia está profundamente impregnado de cultura, desde o simples “bom-dia” pela manhã até nossos ideais mais elevados. Não podemos portanto conhecer alguém, avaliar sua fala, julgar seu comportamento, sem conhecermos sua cultura. No interior de uma cultura nada é exótico, tudo é sensato. Privar alguém de sua cultura é desorientá-lo completamente, é fazê-lo perder sua identidade.

Evangelizar ou proclamar a fé cristã significa anunciar o desígnio salvífico de Deus, revelado em Jesus Cristo, para toda a humanidade. É uma mensagem que interpela a liberdade, que exige compromisso, enfim, que deve ser vivida. Dirigida a povos de outras culturas, ela já encontra uma sociedade organizada, humana, coerente, conforme seus padrões culturais próprios. Eles plasmam a vida cotidiana e dão identidade própria a um povo. Já o anúncio do Evangelho a um outro povo é sempre feito a partir da fé cristã já expressa e vivida na linguagem e na cultura do evangelizador. Este deve estar atento para não impingir seus próprios valores culturais como se fossem valores evangélicos.

A evangelização correta, hoje conhecida como inculturação da fé, deve permitir que os membros de uma cultura exprimam e vivam o Evangelho sem ter que renunciar a suas referências existenciais próprias. Poderão assim manter a própria identidade, poderão assim viver como nativos, mas de modo cristão. Naturalmente sua cultura sofrerá mudanças, o que é normal, pois toda cultura está em contínuo processo de adaptação aos novos desafios e aos novos conhecimentos. Todos nós vivemos hoje mudanças culturais aceleradas, que nos desorientam e atemorizam. A evangelização da cultura implica tais mudanças, desde que fique claro (o que nem sempre é muito simples) que certos traços culturais realmente se opõem à mensagem evangélica.

Os demais componentes culturais de um povo não só devem ser respeitados, mas valorizados mesmo, pois é neles que a fé cristã deste povo poderá ser convenientemente expressa e vivida. Caso contrário ela não será compreendida e menos ainda traduzida na vida. Viver como cristão na própria cultura, eis o desafio da inculturação da fé, que só poderá ser perfeitamente respondido pelos nativos de uma cultura. Ser um indígena cristão, como também se deve ser um africano cristão, um europeu cristão, um asiático cristão. Como as culturas se fundamentam em tradições religiosas o diálogo inter-religioso deve acompanhar este processo. Como vemos trata-se de uma tarefa delicada e difícil, que requer tempo e paciência, mas muito necessária. Como diz João Paulo II: “uma fé que não se torna cultura é uma fé que não foi plenamente recebida, não inteiramente pensada, não fielmente vivida”.

 

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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