Jose-Albertoatualizado

Ex-Director do INETI (Coimbra)
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Na introspeção dos portugueses reina a pergunta «até quando o calvário vai durar?». Os mais crentes, já se colocaram nas mãos de Deus e/ou dos Santos, a quem dedicam mais de perto a sua fé. Vejam-se as notícias e comentários nas TVs, ouçam-se as rádios ou leiam-se os jornais, nada existe que acalme a angústia que reina, mormente, nas classes média e baixa. Mas, o pior de tudo, é olhar para o horizonte e não vislumbrar um caminho que dê alento para vencer a espinhosa jornada que temos pela frente, de onde se ergue uma dívida impagável e, provavelmente, um segundo resgate. Reiterando o que escrevi há meses atrás, começo a acreditar que Portugal está metido num buraco cavernoso e anda a ser governado por linhas travessas e artes de prestidigitação, artigo que me levou ao romance “Germinal” de Émile Zola e à vida sofrida dos mineiros no tempo em que a carvão era a matéria-prima energética mais cobiçada no mundo.

Hoje, temos energias limpas mais perigosas do que o carvão e temos políticas monetárias mais agilizadas, mas que não dependem só do Deve/Haver. São políticas tuteladas pela ditadura dos mercados-financeiros apoiados pelo Neoliberalismo que instituiu nas sociedades, à maneira da “Natureza Bruta”, a lei do mais forte, do mais apto, do mais ardiloso, em suma, do predador e da presa. O Neoliberalismo tem duas grandes escolas: a Austríaca e a de Chicago, onde se especializou o ex-ministro das finanças V. Gaspar. Entre os políticos neoliberais, ficaram para a História R. Reagan (USA), A. Pinochet (Chile) e M. Thatcher (UK). No Chile, além das atrocidades do ditador, ficaram célebres os “Chicago Boys”, nome dado a um grupo de jovens economistas oriundos da Escola de Chicago, que delinearam a política económica de Pinochet, mais tarde readaptada por Thatcher no Reino Unido. Esta é a razão pela qual P. Coelho escolheu V. Gaspar para ministro das finanças, que funcionava ao jeito do avalista relativamente à pressão dos mercados.

O teor da carta de demissão do ex-ministro das finanças e o que ficou pendente nas entrelinhas têm vindo a clarificar-se mostrando que P. Coelho, P. Portas e Maria L. Albuquerque não são reconhecidos como avalistas e que as medidas tendentes ao crescimento económico são tidas pelos mercados financeiros como quimeras de adolescentes. Para agravar a situação, Cavaco Silva, P.  Coelho e P. Portas andam desafinados, não clarificam o rumo político e o país anda à deriva. Não admira, por isso, a necessidade de um segundo resgate, que virá a público com um nome fictício.

Atirar as culpas dos insucessos para o Tribunal Constitucional é lavar as mãos como Pilatos, tanto mais que P. Coelho, quando apresentou o programa para as legislativas, não incluiu medidas de austeridade embora abordasse a reformulação do Estado. M. Thatcher tratou deste assunto no Reino Unido, onde serviços e organismos públicos foram reorganizados tendo em conta as instituições indispensáveis, por exemplo na justiça, saúde, ensino, investigação e desenvolvimento. Por cá, o governo devia estar a tratar do assunto sem demora, mas preferiu atuar sobre os pensionistas e reformados. Alterar de modo unilateral, compromissos assumidos, só revela que o Estado Português não é pessoa de bem. Além do mais, as instituições políticas continuam a gastar à tripa-forra. Sem contar com as benesses de ex-políticos, vejam-se os orçamentos do Gabinete do Primeiro-Ministro e da Assembleia da República que mostram que o exemplo não vem de cima.

E, por tudo isto, vale a pena continuar a lembrar Émile Zola, desta feita em J´Accuse, um artigo alusivo ao caso Dreyfus, publicado no L´Aurore em 1898. O resultado das autárquicas é consequência direta da política em jogo.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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