Certa vez, um jovem perguntou a um sábio: “Mestre: o que é a vida?”. E o velho sábio, então, respondeu: “Vai por esta rua, caminha por ela e visita as três primeiras tendas que encontrar”. O jovem entrou na primeira tenda que encontrou e viu que as pessoas trabalhavam com metal. Logo depois entrou na segunda tenda e observou as pessoas trabalhando com cordas. Por fim, o jovem entrou na terceira tenda e encontrou uma carpintaria. “Será que a vida se reduz a isso?”, questionou o jovem retornando ao velho sábio que finalmente lhe disse: “Agora você encontrou o caminho para descobrir a vida e um dia compreenderás”. O jovem ficou muito aborrecido por não ter entendido o discurso do sábio, mas, como nada podia fazer, foi percorrer o mundo. Tempos depois, chegou a um jardim onde ouviu uma música tocada por um instrumento que não conhecia. Era uma cítara. O jovem ficou encantado com o som e, de repente, percebeu que os carpinteiros, os ferreiros e as outras pessoas que trabalhavam nas tendas faziam parte da construção de um todo. O jovem teve um estalo, levantou-se e dançou. O músico, surpreso, parou de tocar, mas o jovem continuou dançando e o músico perguntou: “O que há com você?” O jovem, então, respondeu: “Agora entendi o que é a vida. Alguns meses atrás entrei em três tendas e não havia cítara, nem havia música, mas todas as peças estavam lá. Precisava, apenas, colocá-las em ordem e reuni-las em um todo”.
A maioria dos seres humanos não possui alternativa: durante nossa existência somos obrigados, de alguma forma, a agir para alcançarmos o sustento de nossa vida. A esta ação consciente de sobrevivência chamamos de trabalho. O trabalho constitui-se em um fenômeno antropológico ligado intimamente às relações sociais e históricas e possui sempre um significado dúbio. Por um lado, o trabalho é para o ser humano um peso, um sofrimento, uma alienação ou até mesmo um castigo, sentido este que podemos encontrar na Bíblia. “Com o suor de teu rosto comerás teu pão” (Gn 3, 19). Ao mesmo tempo que o trabalho é associado à labuta, à obrigação sacrificante, é difícil imaginar a auto-realização, a possibilidade de satisfação, autonomia e dignidade humana sem pensarmos em uma atividade, em um fazer contínuo, ou seja, no trabalho. Sem dúvida alguma, o trabalho torna-se um fardo quando está dissociado de nossas aptidões, ideais e sonhos e encontra-se reduzido a uma simples forma de sobrevivência. A partir do momento que podemos conciliar a satisfação de uma atividade com o meio de sustento de nossa vida, o trabalho, mesmo que sacrificante, deixa de ser um peso ou uma obrigação e passa a ser uma experiência concreta de realização pessoal. “Não foi quando descobriu a América, mas quando estava prestes a descobri-la, que Colombo se sentiu feliz” (Dostoievsky). Sendo uma atividade que nos pesa ou nos realiza pessoalmente, o trabalho possui um significado primordial para o universo da pessoa humana. Através da atividade profissional transformamos e construímos a terra, seja positiva ou negativamente, dele retiramos o sustento da vida e concretizamos sonhos. Por ser uma atividade contínua, o trabalho também nos constrói, ou seja, influencia a nossa maneira de ser e de agir. “Somos aquilo que fazemos repetidamente” (Aristóteles).
Apesar de sua importância, o trabalho não pode significar a essência da vida humana. A expressão judaico-cristã que complementa o trabalho chama-se “descanso”. O descanso na cultura judaico-cristão não significa simplesmente a recuperação de forças para que possamos voltar mais tarde para o trabalho. A interrupção de nossos afazeres possui como função a criação de um tempo, no qual possamos saborear a vida, conviver com nossos semelhantes, nos voltar para nós mesmos e para Deus. O trabalho possui neste espaço de encontro multidimensional o seu limite. Afinal, o trabalho não é o objetivo da pessoa humana e esta não pode se alienar da vida num eterno fazer sem sentido. “Não há nada mais terrível do que a ignorância ativa” (Goethe). O descanso é necessário para que possamos pensar sobre o sentido de nossa existência e principalmente perceber se a vida está se desenvolvendo na direção de nossa satisfação. Ao mesmo tempo que o trabalho é a participação para o sustento de toda uma sociedade, o descanso é o momento que a sociedade pode perceber o quanto ela está sendo um espaço de verdadeira vida. Afinal, o ser humano não é uma peça na engrenagem de uma grande máquina, mas aquele que deve criar e saborear a música do universo. “Brincar é condição fundamental para ser sério” (Arquimedes).