ZeCarlos2

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Como vai, como vai, como vai? Muito bem, muito bem-bem-bem…

Pouco a pouco, à medida que fomos crescendo, a programação da televisão foi se apurando e nós, sendo seduzidos pela telinha. Os pais deixaram de sentar-se nas calçadas para assistir ao Repórter Esso. As mães também acabaram abrindo mão da prosa com as vizinhas para assistir aos “emocionantes” capítulos das telenovelas. E as crianças passaram a ter programas infantis que iam das cinco às sete da tarde, com os desenhos do Pica-pau, Frajola e Piu-piu, Gato Félix, Bip-bip e todos os que iam surgindo. E naquela época ainda não se sonhava com computadores e, muito menos, com algo como a internet.

As crianças brincavam na rua, mas apenas pela manhã, ou à tarde, dependendo dos horários escolares. Soltavam pipas, jogavam bolinhas de gude, brincavam de pique-esconde, andavam de bicicleta pelos arredores.

Durante a adolescência fui perdendo o contato com esses hábitos, comecei a curtir as namoradas (que eram todas virgens, como eu) ou as saídas com os amigos para bailinhos ou cinemas. Depois, os estudos foram apertando nossos horários, a faculdade, o primeiro emprego e a maturidade. O universo infantil nunca esteve tão distante. Também não sei dizer como nem quando me perdi dos meus pais.

A televisão ganhou cores e foi se tornando cada vez mais acessível a todos. As notícias foram se aproximando no tempo, os jogos de futebol transmitidos ao vivo. Já havíamos visto o homem pisando a lua e imagens de guerras longínquas. Mulheres belíssimas coroadas como Miss Universo. Mas não se conversava mais, nem mesmo em família. O único som em nossas salas era o da tv. Os jovens se afastavam dos pais e, alguns, de casa. Sem serem notados.

O movimento hippie, o sexo livre (faça amor, não faça a guerra), as drogas alucinógenas passaram a habitar nossos dias. Já ouvíamos (ou víamos) notícias de gangues violentas em metrópoles como Nova Iorque, por exemplo. Mas tudo era tão distante que nem percebíamos as drogas e a violência se infiltrando lentamente em nossas cidades, em nossos bairros, em nossas ruas. Ainda tínhamos uma certa inocência.

De repente, acordamos assustados, violentados com alarmes e grades envolvendo nossas casas. Notícias inconcebíveis da morte violenta de um casal de namorados adolescentes, perpetrada barbaramente por outro adolescente. De pais barbaramente assassinados, com o auxílio da filha bem nascida e bem criada. De bandidos presos que orquestram seus comandados para aterrorizarem as maiores cidades do país. De uma família queimada viva, com um garotinho de cinco anos, dentro de um carro. De passageiros queimados vivos dentro do ônibus. De um garotinho de seis anos, arrastado por sete quilômetros, enquanto seu corpo se despedaçava, preso ao cinto de segurança do carro roubado da própria mãe que assistiu, impotente, esse martírio medieval… e outras crianças, sendo atingidas por balas perdidas no caminho da escola, ou dentro da “proteção do seu lar”!…

Serão essas as antigas ternuras dos nossos netos?

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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