Ina Um são joão

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As noites frias de junho sempre traziam grandes recordações para Diva moça simples do interior.  Depois de quatro décadas, vivendo na cidade grande, ela nunca deixou de recordá-las com saudades. Um  São João  marcou sua vida para sempre.

Desde menina, que as festas juninas lhe enchiam de felicidade. Gostava de ajudar no Arraial da Igreja, passava dias e dias a cortar papel de seda colorido  para fazer bandeirinhas. Neste ano em especial, iria se despedir dos amigos e conhecidos. Estava seguindo para a Capital do País, onde iria estudar e enfrentar o mundo.  Com 18 anos, não tinha um namorado certo, ou mesmo um amor, apenas alguns amigos de infância, quase que irmãos.

Nesta noite, caprichou no vestido de matuta, com bolinhas vermelhas e brancas, enfeitado de fitas coloridas. Ao se pintar, não esqueceu de fazer o tradicional coração na face esquerda. A noite prometia. Na cidade havia uma irmandade entre as pessoas, quase todas nascidas e criadas ali. Seus pais eram muito respeitados, pela vida íntegra que levavam.

José Murilo desde pequenos, era o seu maior amigo. e parceiros para toda hora. Algo  muito forte sentia quando estava perto dele.  Nesta noite, iria ter o seu primeiro caso de amor e por isso o  escolhera. A fogueira queimava  e as labaredas alta iluminavam á noite. A música ressoava por toda praça da Matriz, onde barracas ofereciam os melhor quitutes da época. Não costumava beber mas  hoje seria diferente.

A roda de amigos estava animada e os quentões passavam de um para outro. As faces coradas dava aquelas jovens uma impressão de grande felicidade. Perto da meia noite, ela e Murilo dançavam animados, quando matreiramente, olhando-o dentro dos olhos, o convidou para ir até ao rio. Saíram sorrateiramente e logo estavam à beira do Una, tendo como testemunha apenas lua cheia e o cheiro do mato.

Nos braços do outros e ali mesmo, entre as finas  areias se amaram com intensidade.  Parecia que tinham feito isso a vida toda. Os corpos jovens e nus rolando de um lado para outro, não lhes causava nenhum pudor. Longe, a sanfona tocava uma música onde o amor era celebrado. …”olha pro céu meu, vê como a noite está linda”…..”foi numa noite igual a este que tu me destes o teu coração”… E assim aconteceu a sua iniciação.

No outro dia, ele foi acompanhá-la à estação e a vida cuidou de separá-los para sempre.   Só depois de alguns anos, foi que novamente se deixou amar por alguém. Não casou e teve uma vida plena. Vez por outra ia à sua vila natal, mas nunca nas festas juninas. Os pais vieram morar na Capital e hoje, Diva, mulher sessentona, só e livre decidiu que iria passar o São às margens do Rio Uma. Algumas amigas estavam casadas, com filhos  e netos. Seus pais, ao a acompanharam. 

Ao chegar, encontrou a Praça da Matriz iluminada e enfeitada com bandeirinhas coloridas, tal qual naquele tempo. O movimento agora era maior, carros, motos e muita gente circulava de um lado para o outro. Hospedou-se no Hotel principal, cujos donos eram seus amigos. Quase às onze horas da noite, depois de circular pelas barracas, abraçar uns e outros velhos conhecidos.

 Esgueirou-se e caminhou até às margens do Rio. Lá, encontrou um tronco de árvore que as águas tinha trazido na última enchente. Sentou- e ficou a rememorar aquela noite onde ela tivera o seu primeiro contato físico com um homem. O seu corpo palpitava só de lembrar das carícias e beijos trocados. Realmente, a juventude não tem juízo, pensava, quando viu que alguém se aproximava. Temerosa quis se levantar, mas ao ver o vulto alto  e um pouco curvado parado à sua frente, recuou.

 Será que estava sonhando, ou era mesmo Zé Murilo que estava ali ao seu lado, falando baixinho, dizendo que nunca mais tinha voltado aquela lugar. Hoje, depois de uma vida de lutas e sucessos, resolvera matar as saudades. Nunca imaginou que iria encontrá-la, talvez tudo fosse uma artimanha do destino. Conversaram sobre os mundos diferentes em que viviam e ele disse que recentemente tinha perdido a esposa num acidente de carro.

 Ela ainda era a mesma  e tranquila mulher, com uma vida comum. Não casou, e alguns amores alimentaram o seu coração. De mãos dadas, eles se abraçaram e novamente se amaram à luz da lua. Ao longe, fogos de artifício espocavam no céu, fazendo cair chuvas de estrelas. Rindo, apesar do tempo passado, nos seus ouvidos, a música era a mesma da primeira vez. Dali em diante, suas vida seguiriam juntas, até ao final dos tempos. Recife/Junho/2015.

Obs: Imagem enviada pela autora.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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