Ex-Director do INETI (Coimbra)
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A comemoração dos quarenta anos do 25 de Abril já pertence ao passado, muito embora tenha ficado, para futuro, a polémica havida entre a AR e os Capitães de Abril, que reforçou o baixo índice de popularidade dos atuais políticos.
Depois da revolução dos cravos e, muito em especial, depois do PREC, ninguém conseguiu prever que os parâmetros que consubstanciavam a política dos três D (Descolonizar, Democratizar e Desenvolver) impunham um caminho espinhoso. O índice demográfico caiu abruptamente, as populações envelheceram dando espaço à ascensão não só do liberalismo económico mas também de predadores, que desenraizaram a social-democracia e a democracia cristã. É uma realidade que começou a despontar nos tempos do Bloco Central e prosseguiu nos governos de Cavaco Silva. Pelo caminho, só Guterres teve a coragem de se demitir, assumindo que caminhávamos para um pântano, não aceitando ser fantoche como Presidente da Comissão Europeia. Barroso aproveitou a deixa, deixando Santana Lopes no seu lugar, que foi o PM português mais equivocado consigo mesmo. Sócrates, embrulhado num positivismo à moda de Comte, escolheu caminhos da escola Keynesiana à base de obras públicas, que só agravaram a herança até que, Passos Coelho, abraçando o liberalismo no sentido mais puro, obrigou a classe média a pagar o custo de muitas e más governações. Bem ao jeito de uma postura austera do foro Kantiano – antipático, presumido mas não pontual – o atual PM despontou para pôr em prática “A Crítica da Razão Impura” – enquanto na oposição surgia um Seguro demasiado inseguro.
Nas sinuosidades do destino, os portugueses foram obrigados a brigar com o presente, engolindo, em seco, a amargura marcada por lampos de cansaço que asfixiavam a alma. Ainda desabituado aos quês da nova UE, Portugal passou a calcorrear as múltiplas azinhagas impostas pela ação política governamental, constituídas por caminhos recheados de ratoeiras, recheados de chocalhos de cabras de ovelhas e bois, facto pelo qual se tornou difícil acreditar no futuro. Sempre que o tempo exige mais tempo para alcançar uma tarefa, a vida fica para trás afogada na anabolia da redenção e nos interstícios de desejos comezinhos típicos da natureza humana.
Depois da derrota da derrota do PREC, em 25 de Novembro de1975, as duas grandes linhas do pensamento que emergiram no âmbito da dualidade maniqueísta do que se usa chamar de direita e esquerda foram: a) esquerda – social-democracia enganchada em objetivos nobres que envolviam a tolerância, a criação de uma ampla classe média culta e idealista, amiga do ensino, da saúde, da justiça, da solidariedade, da velhice, e de outras causas sociais a que também não eram alheios, atributos da democracia cristã; b) direita – liberalismo economicista apoiado nos mercados financeiros, considerados como entidades reguladoras das sociedades, onde, à moda da lei da selva, era preciso lutar pela sobrevivência, como qualquer espécie animal inserida nas cadeias alimentares de Darwin.
Com políticos desta estirpe, Portugal não sairá do pântano que Guterres profetizou, mas um novo 25 de Abril nada resolveria. Dos cravos vermelhos de 1974, o país meteu-se numa roseira brava cheia de espinhos em vez de escolher as rosas da Rainha Santa e as vistas largas de um D. Dinis. Vivendo um presente inimigo da juventude e dos velhos que os sustentam, não há futuro. Direi mesmo que, para aqueles que acreditam em existências transcendentais, o Diabo dedicou uma atenção peculiar ao nosso país! Por isso, não admira que o povo e, em especial a classe média, não se revejam nos tempos que correm, durante os quais a dívida não se cansa de aumentar em troca de juros baixos, facto que tinge o país de uma tragédia negra.
Que me interessa que Kant cante e que Comte conte, se o atual Kant não passa de um pedante e o atual Comte tem laivos de um augusto bifronte. Opresso de desdém perante o exagero insólito da austeridade segregacionista, só nos resta esperar que os futuros governantes sejam mais inteligentes, mais humanistas, mais pedagogos e mais engenhosos.