Decide a Câmara dos Deputados, à revelia dos eleitores, da moral e dos bons costumes, conceder às mulheres dos deputados e aos maridos das deputadas passagens de avião pagas com o nosso dinheiro. É a farra aérea.
Já que o ajuste fiscal não se aplica às Suas Excelências, por que não estender a prebenda às sogras e genros, filhos e netos? Que viaje toda a família nas asas do despudorado nepotismo abastecido pela malversação do dinheiro público.
Machado de Assis prefigurou o Brasil de hoje no Conto de escola, ambientado em 1840. Na sala de aula, Raimundo, em troca de “cola”, passa ao colega Pilar uma moeda de prata. Toma lá, dá cá. Porém, o colega Curvelo andava de olho. E delata a negociata ao mestre Policarpo, que castiga os corruptos com “bolos” de palmatória.
No Brasil republicano, aplicar palmatórias não é permitido a nós, eleitores. Até que venham as próximas eleições, não temos como punir os nobres deputados prestes a aprovar, em nome do ajuste fiscal, as medidas que penalizam ainda mais os pobres: redução do acesso a benefícios da Previdência Social, ao seguro desemprego e ao abono salarial. Enquanto isso, seus cônjuges ajustam o cinto em viagens aéreas…
Será, como insinua Machado de Assis, que só nos resta ir atrás do diabo do tambor?… Ora, melhor sugerir às Suas Excelências que façam bom uso de sua moeda de prata e aprovem também auxílio-balada para filhos adolescentes, abono-socorro a parentes endividados e bolsa família de grife, com direito a jatinhos executivos para levar toda a prole de férias a Miami.
Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do Poder” (Rocco), entre outros livros.
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