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          Os amigos hão de perdoar a minha ausência. Mas festa de aniversário de quinze anos e cerimônia de casamento, proclamo para quem interesse tiver, não irei. Risquei do meu traçado, tanto uma, como a outra. Prefiro um velório quando o defunto não é da família. Muito mais divertido. Primeiro, não há música para atrapalhar a conversa, a gente caminha de um lado para outro, ouve casos do falecido e conta piadas. E não tem essa história de a noiva chegar atrasada, porque se tornou moda, nem se torna necessário vestir um terno, sobretudo quando o terno já é meu macacão de trabalho.

            De uma vez por todas, enchi o saco. Do casamento, por exemplo, começo com o atraso da noiva. Sem ir, não corro o risco de jogar uma praga e pegar. Foi uma vez. Fui ao casamento. A noiva chegou com duas horas de atraso. Ela, entrando por uma porta, eu, saindo pela outra. Devo ter tido algum pensamento maldoso. Algum tempo depois, soube da separação, aliás, bem tumultuada. Fiquei com a consciência doendo. Teria sido minha praga, por permanecer duas horas sentado num banco?

            De festa de aniversário, a outra moda de só ter início depois das vinte e duas horas. A gente sentado, sem poder conversar porque o som é alto – som, não, barulho, que aquilo que se toca não é música, parecendo mais o som de macaca apanhando -, só mastigando e bebendo. Ademais, aboliram a empada e eu não concebo aniversário sem empada. Quando o primeiro garçom aparece, pergunto logo se tem empada, para ficar decepcionado. Depois, a frescura do cortar o bolo, a taça de champanhe que ninguém bebe – é só para conferir ares de nobreza nas fotos -, o que só vai ocorrer depois de meia noite. Não, paciência, não vou mais.

            Velório, não, em absoluto. Tirando o defunto, na sua palidez, acomodado no caixão, o resto é animado, apesar de não ter salgadinhos nem bebida. É até saudável, à medida em que a gente chora e lubrifica os olhos, observa que a morte existe, porta que democraticamente se reserva para todos. Quando for prefeito, vou abolir as festas de aniversário de quinze anos e a cerimônia de casamento. Só permito o velório, sobretudo o dos meus adversários.

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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras

 Obs: Publicado no Diario de Pernambuco

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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