Djanira Silva 5 de dezembro de 2011
          As pessoas simples, criadas sem ouvir mentiras nem propagandas de rádio e televisão, entendem as coisas ao pé da letra. Tive uma empregada nascida e criada como se costuma dizer, no mato, dona de uma simplicidade tão grande que dava até trabalho para a gente se entender com ela.
          Certa vez cheguei do trabalho morrendo de fome, e perguntei:
          – Quitéria, você fez o cuscuz que mandei?
          – Fiz não senhora, esqueci.
          – Eu estava na repartição sonhando com ele.
          – Oxente, e a senhora tava lá drumindo?
          De outra vez cheguei da granja com umas mudas de coqueiro anão. Ao descer da caminhonete recomendei:
         – Coloque tudo embaixo da mesa do terraço com os olhos virados pra cima. Era tudo dentro de uma cesta grande e levou pra cozinha.
          Sentada no terraço esperei que voltasse para buscar as outras. Passou um tempão e nada de Quitéria.
          Vendo que ela não voltava fui ver o que estava acontecendo.
          Fui encontrá-la, ajoelhada, os olhos virados para cima, tirando bem devagar as mudas de coqueiro de dentro da cesta e arrumando-os embaixo da mesa.
          Tinha os olhos arregalados, virados para cima, e tentava encontrar o lugar certo para cada um:
          – O que diabos você está fazendo, criatura?
          – Oxente, dona, a senhora mandou botar os cocos com os olhos virados pra cima? Eu tô botando.
Obs: Texto retirado do livro da autora – Maldição do Serviço Doméstico e outras maldições.
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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