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Era o domingo de Páscoa! Davi, que é um menino madrugador, acordou mais cedo ainda, que de costume, e especialmente bem humorado!

– É Páscoa! – ele gritou da cama, pra inaugurar o dia, despertando com o grito de saudação e com um enorme sorriso, a casa toda.

Na véspera, já deitado entre as cobertas macias, o sono que não vinha, sentiu o cheirinho morno de coisa boa assando…

– Tá fazendo pão, mamãe?

– Tô sim, meu filho. Mas agora dorme e descansa. Amanhã você tem que procurar os ovinhos…

Lembrando da alegria das outras páscoas, Davi acabou adormecendo e sonhou que crescia. Estava chegando seu nono aniversário e ele lembrava já de tantas pegadas de coelhinhos, tantas novidades que aconteciam nesse época, repetindo quase os natais, tudo misturado com o prazer de suas próprias festas: o Peter Pan, o Pequeno Príncipe, o Pedrinho do Sítio do Pica Pau, o jogador de basquete flamenguista… quantos heróis já tinham sido um pouco ele, soprando velas em bolos tão gostosos, que a mãe sempre preparava assim, de noite… Dormiu, assim, envolvido em doces recordações…

O fato é que no dia seguinte, Davi acordou maior e daí, talvez, aquela animação tão grande. Estava se sentindo pronto para começar a grande caçada dos presentes que o Coelhinho sempre deixava.

Foi fácil. Nem pegadas tinham, dessa vez, mas ele parecia já saber os caminhos possíveis e encontrou: dois cestos diferentes, enfeitados para ele e sua irmãzinha, a Lúcia, que vinha atrás, adorando a brincadeira de “seguir o chefe”… Biscoitinhos caseiros, ovos de chocolate… Que delícia! Uma vez por ano não ia ouvir a mamãe dizer que açúcar faz mal pra saúde.

Mas continuou procurando…

– E os ovos de vocês? O Coelho não trouxe ovos para os grandes?

– Talvez não, meu filho. Mas não se preocupe com isso.

A mãe estranha que, pela primeira vez, ele pensou no significado da festa para os adultos.

Foi um domingo delicioso!

Na sexta-feira anterior, ele mesmo havia modelado com argila, no sítio da vovó, coelhinhos, ovinhos e um poderoso Espírito Santo, um pássaro muito especial, que foi surgindo misteriosamente no barro, quando ele tentava fazer… imaginem… um punhal! A transformação espontânea da terra, que teimava em lhe mostrar outra coisa, intrigou o artista, mas no fim, orgulhoso com os bons resultados, ele fez questão de embalar tudo com muito cuidado, para decorar, em sua casa, a mesa da Páscoa. Fez também modelagens para a vovó e a bisa e não se despediu sem determinar os lugares onde os trabalhos deveriam ficar expostos.

No domingo, mamãe caprichou no almoço, um pão maravilhoso, da melhor tradição portuguesa (das origens maternas), enriquecia a refeição e o vovô e a vovó (pais do papai) vieram de longe trazendo outras tantas alegrias.

De tardezinha, ao lado da mãe e da irmãzinha, ele não consegue adiar e quer saber, de repente:

– Mãe, Coelhinho da Páscoa existe mesmo, ou são vocês que dão os ovos?

Mamãe se espanta com a objetividade da pergunta e não responde logo. Ele insiste, e ela propõe que conversem sobre isso mais tarde, quando a pequena Lúcia for domir. Mas quer saber dos sentimentos dele:

– Você ficou feliz? Foi um dia gostoso, meu filho?

– Muito! Mas existe ou não existe?

– Depois a gente conversa, Davi… De noite…

Quando o depois chega, mamãe aguarda o movimento do menino. Hesita. Será que ele quer mesmo que ela lhe diga? Ao mesmo tempo sabe que a relação entre falso e verdadeiro é uma questão importante para o menino naquele momento. No dia a dia, quando ele exagera no mergulho das fantasias e tenta envolver os outros em suas histórias imaginárias, para obter algum ganho, é alertado de que isso não é correto. Mentir não é certo, é a lição vêm tentando lhe ensinar, cada dia um pouco.

– Mãe, vamos conversar agora. O Coelhinho da Páscoa existe mesmo ou são vocês que nos dão os presentes?

– Você gosta dessas brincadeiras da Páscoa, Davi? Se divertiu com elas?

– Claro! Mas existe? Diz, mãe!

– Olhe, meu filho, desde que você era bem pequeno, nós temos brincado de procurar os ovinhos e sempre foi tão bom! Os papais e as mamães preparam tudo para essa brincadeira poder acontecer. Foi assim com você e agora chegou a vez de sua irmã. Eu não te respondi logo e esperei estarmos só nós dois, por isso: para que ela possa aproveitar, tanto quanto você, esse jogo todo, que repetimos a cada ano. De verdade, é tudo uma grande brincadeira, onde os pais e os filhos brincam juntos. Essa brincadeira é que é o coelhinho.

– Então são vocês que fazem tudo isso?

– É meu filho. Os grandes preparam a festa, para todo mundo aproveitar junto.

Davi, emocionado, abraça a mãe.

– E eu não vou poder mais brincar, então?

– Claro que pode, meu filho. E tem mais: se quiser, agora você poder vai ajudar a preparar a brincadeira. Isso também é brincar. A diversão começa ainda mais cedo, só isso. Enquanto a gente prepara, já está brincando…

O menino olha encantado para a mãe e sorri de um modo muito especial. Compreende os sonhos daquela noite e sabe, também, porque acordou tão contente.

Depois, na hora de se despedir do dia, já na cama, percorrendo, na lembrança, os caminhos de volta ao amanhecer, ele se lembra de um detalhe e insiste, ainda:

– Mãe, mas… e as pegadas?

– Ah, Davi, as pegadas do coelhinho éramos eu e o seu pai que fazíamos, para você poder achar os ovinhos mais rápido… No próximo ano, talvez você possa nos ajudar a fazer as marquinhas, para a Lúcia aprender o caminho também…

Os olhinhos cansados de Davi, acendem-se de entusiasmo, como estrelinhas, piscando na escuridão do quarto…

– Boa noite, mamãe! Adorei a Páscoa!

– Durma bem, meu filho… Bons sonhos!

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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